“Quanto mais perto você chega dele, a velocidade da luz diminui, a informação fica confusa, mentes racionais se tornam ilógicas, histéricas. É um espaço-tempo torto, como a massa de um sol gigantesco curvando a região que o cerca. Você se estica para pegar algo perto e descobre que nunca esteve ali.” (PESSL, 2014, p.336)
Ashley Cordova é encontrada morta aos 24 anos de aparente suicídio e sua morte desperta o interesse do jornalista investigativo Scott McGrath. McGrath tem um histórico com a família de Ashley já que o misterioso cineasta Stanislas Cordova, pai da moça, foi o alvo de uma investigação prévia que acabou custando o emprego e a família do jornalista há alguns anos. Para investigar Ashley, McGrath precisará adentrar mais uma vez o bizarro e aterrorizante mundo criado por Cordova em seus filmes e para isso contará com a ajuda de Hopper e Nora que tiveram contato com a moça pouco antes da sua morte.
O primeiro destaque de “Filme Noturno” é sua narrativa incomum, recheada de fotos, trechos de jornais, revistas e sites e diversos tipos de relatos e anotações. Além de deixar a edição linda, de alguma forma essa estratégia faz com que a história pareça ainda mais real, pois é como se a autora colocasse a investigação nas mãos do leitor tanto quanto a deixa na dos personagens, dizendo: “Você está em posse das mesmas evidências. Vá fundo e descubra por conta própria”. Outro fator que contribui para acreditarmos que tudo é real é contextualização dos filmes do Cordova. Conhecemos os roteiros de seus filmes, algumas histórias de bastidores e vemos o tempo inteiro menções a filmes que de fato existem. Assim, é fácil acreditar que a obra do diretor é real e, a partir do momento em que se acredita nisso, se acredita em todo o resto, o que faz de “Filme Noturno” uma experiência que absorve o leitor para dentro de suas páginas e não o deixa sair até o final.
O ritmo é envolvente desde as primeiras páginas e mesmo não contando com reviravoltas de tirar o fôlego a trama não decepciona, pelo contrário. Ao invés de guardar surpresas para o final, o que Marisha faz é espalhar informações ao longo do livro e juntá-las aos poucos, até que no final tudo faz sentido. Ainda assim, a autora brinca com o leitor e o surpreende, mostrando a engenhosidade de sua trama. A verdade é que “Filme Noturno” conta uma história que poderia ter dado muito errado, mas Marisha Pessl acerta em cheio na execução. Tudo soa tão real que eu acabei aceitando algo que jamais aceitaria em outros livros. Isso porque não parece que o desfecho é algo que alguém escolheu para uma história e sim o que de fato aconteceu aos personagens. Na verdade, é de maneira geral Marisha se revela hábil em fazer o leitor acreditar que o que está lendo não é apenas uma história inventada para um livro.
Os personagens são poucos, mas todos bem construídos. Quanto ao trio protagonista, Hopper (o que mais se destacou para mim) é o mais misterioso a princípio devido ao seu passado e seu relacionamento com Ashley; Nora é a menina que vai para Nova York tentar a vida como atriz e aos poucos mostra o seu valor e cativa ambos os personagens; McGrath é aquele que decide descobrir a verdade e irá até o fim para encontrá-la. Sendo o protagonista e narrador, achei curioso que fosse o menos interessante dentre os três, mas isso possivelmente se dá porque, acompanhando a história por seu ponto de vista, qualquer mistério sobre ele se perde, já que temos acesso à sua consciência, enquanto a dos outros é revelada aos poucos.
Mas a essência da história está mesmo em Ashley e Cordova (esse último o responsável por me deixar mais curiosa a cada página, na expectativa de conhecê-lo ou, pelo menos, entendê-lo melhor). Cordova é o mistério a ser revelado. A história é misteriosa porque ele é.
O que torna o livro interessante desde o começo é que as duas histórias (da morte de Ashley e do universo criado por Cordova, tanto em seus filmes quanto ao seu redor) se entrelaçam e é difícil dizer sobre qual se trata o livro já que uma se sobrepõe a outra o tempo todo. Eu diria que a história é sobre o diretor e que Ashley é a desculpa para ela nos ser contada. Recluso, intenso, a favor de experiências que tirem as pessoas de suas zonas de conforto, as deixando perturbadas sem jamais poderem voltar a serem as mesmas. Esse é Stanislas Cordova. Esse é o mundo que cria em seus filmes, que cerca os que têm contato com sua obra, que McGrath, Nora e Hopper se propõem a adentrar e que Marisha Pessl tenta trazer para o leitor. Mas não entenda com isso que o livro é assustador. Mesmo se valendo de temas como o sobrenatural, ocultismo e rituais e girando em torno do bizarro, o livro está longe de ser classificado como terror, sendo apenas um bom suspense.
Enigmático e envolvente. Esse é “Filme Noturno”.
Título: Filme Noturno (exemplar cedido pela editora)
Autora: Marisha Pessl
Nº de páginas: 624
Editora: Intrínseca
Ashley Cordova é encontrada morta aos 24 anos de aparente suicídio e sua morte desperta o interesse do jornalista investigativo Scott McGrath. McGrath tem um histórico com a família de Ashley já que o misterioso cineasta Stanislas Cordova, pai da moça, foi o alvo de uma investigação prévia que acabou custando o emprego e a família do jornalista há alguns anos. Para investigar Ashley, McGrath precisará adentrar mais uma vez o bizarro e aterrorizante mundo criado por Cordova em seus filmes e para isso contará com a ajuda de Hopper e Nora que tiveram contato com a moça pouco antes da sua morte.
O primeiro destaque de “Filme Noturno” é sua narrativa incomum, recheada de fotos, trechos de jornais, revistas e sites e diversos tipos de relatos e anotações. Além de deixar a edição linda, de alguma forma essa estratégia faz com que a história pareça ainda mais real, pois é como se a autora colocasse a investigação nas mãos do leitor tanto quanto a deixa na dos personagens, dizendo: “Você está em posse das mesmas evidências. Vá fundo e descubra por conta própria”. Outro fator que contribui para acreditarmos que tudo é real é contextualização dos filmes do Cordova. Conhecemos os roteiros de seus filmes, algumas histórias de bastidores e vemos o tempo inteiro menções a filmes que de fato existem. Assim, é fácil acreditar que a obra do diretor é real e, a partir do momento em que se acredita nisso, se acredita em todo o resto, o que faz de “Filme Noturno” uma experiência que absorve o leitor para dentro de suas páginas e não o deixa sair até o final.
O ritmo é envolvente desde as primeiras páginas e mesmo não contando com reviravoltas de tirar o fôlego a trama não decepciona, pelo contrário. Ao invés de guardar surpresas para o final, o que Marisha faz é espalhar informações ao longo do livro e juntá-las aos poucos, até que no final tudo faz sentido. Ainda assim, a autora brinca com o leitor e o surpreende, mostrando a engenhosidade de sua trama. A verdade é que “Filme Noturno” conta uma história que poderia ter dado muito errado, mas Marisha Pessl acerta em cheio na execução. Tudo soa tão real que eu acabei aceitando algo que jamais aceitaria em outros livros. Isso porque não parece que o desfecho é algo que alguém escolheu para uma história e sim o que de fato aconteceu aos personagens. Na verdade, é de maneira geral Marisha se revela hábil em fazer o leitor acreditar que o que está lendo não é apenas uma história inventada para um livro.
Os personagens são poucos, mas todos bem construídos. Quanto ao trio protagonista, Hopper (o que mais se destacou para mim) é o mais misterioso a princípio devido ao seu passado e seu relacionamento com Ashley; Nora é a menina que vai para Nova York tentar a vida como atriz e aos poucos mostra o seu valor e cativa ambos os personagens; McGrath é aquele que decide descobrir a verdade e irá até o fim para encontrá-la. Sendo o protagonista e narrador, achei curioso que fosse o menos interessante dentre os três, mas isso possivelmente se dá porque, acompanhando a história por seu ponto de vista, qualquer mistério sobre ele se perde, já que temos acesso à sua consciência, enquanto a dos outros é revelada aos poucos.
Mas a essência da história está mesmo em Ashley e Cordova (esse último o responsável por me deixar mais curiosa a cada página, na expectativa de conhecê-lo ou, pelo menos, entendê-lo melhor). Cordova é o mistério a ser revelado. A história é misteriosa porque ele é.
O que torna o livro interessante desde o começo é que as duas histórias (da morte de Ashley e do universo criado por Cordova, tanto em seus filmes quanto ao seu redor) se entrelaçam e é difícil dizer sobre qual se trata o livro já que uma se sobrepõe a outra o tempo todo. Eu diria que a história é sobre o diretor e que Ashley é a desculpa para ela nos ser contada. Recluso, intenso, a favor de experiências que tirem as pessoas de suas zonas de conforto, as deixando perturbadas sem jamais poderem voltar a serem as mesmas. Esse é Stanislas Cordova. Esse é o mundo que cria em seus filmes, que cerca os que têm contato com sua obra, que McGrath, Nora e Hopper se propõem a adentrar e que Marisha Pessl tenta trazer para o leitor. Mas não entenda com isso que o livro é assustador. Mesmo se valendo de temas como o sobrenatural, ocultismo e rituais e girando em torno do bizarro, o livro está longe de ser classificado como terror, sendo apenas um bom suspense.
Enigmático e envolvente. Esse é “Filme Noturno”.

Autora: Marisha Pessl
Nº de páginas: 624
Editora: Intrínseca