“O Longo Adeus” foi o primeiro livro que li de Raymond Chandler e bastou para me fazer querer conferir outras obras do autor, mesmo que não tenha feito com que eu virasse sua fã. Apenas anos depois, quando já havia lido outros romances e me apaixonado pelo seu estilo que descobri que este era considerado não apenas o seu melhor trabalho como um dos melhores livros da literatura policial de todos os tempos. Imediatamente eu soube que precisava reler. Afinal, eu provavelmente não havia aproveitado a primeira leitura tanto como poderia por ainda não estar familiarizada com o protagonista das histórias do autor, o detetive Philip Marlowe.
Terry Lennox surge no caminho de Philip Marlowe por acidente: bêbado, caindo pelas calçadas, prestes a perder a consciência. Quando Marlowe o recolhe e o leva para casa, os dois iniciam uma estranha relação de amizade. Mas o mais estranho ainda estava por vir. Quando a esposa promíscua de Lennox é assassinada, ele sabe que as suspeitas cairão sobre ele e pede a ajuda do seu novo amigo para deixar o país. A partir disso, outros tipos como gângsters, milionários, escritores best sellers depressivos, médicos trambiqueiros e mulheres fatais cruzarão o caminho do detetive.
Marlowe é um cara das ruas. Justamente por isso seus casos começam do nada ou de algo muito pequeno. Isso se repete em “O Longo Adeus”. Pode se dizer até que o livro se divide em duas partes, já que os primeiros capítulos giram em torno de Lennox, mas a partir de um certo momento é como se uma nova trama tivesse início quando Marlowe é chamado por uma mulher para encontrar seu marido alcoólatra.
“O tempo transforma tudo em coisa vil, miserável e enrugada. A tragédia da vida, Howard, não é que coisas bonitas morrem jovens, mas que fiquem envelhecidas e más.” (CHANDLER, p.333, 2007)
Apesar de manter o estilo do autor, no qual a trama vai se formando de maneira orgânica, esta não chega a ter tantas ramificações o que a torna até mais fácil de acompanhar. No geral, “O Longo Adeus” é simplesmente muito bem escrito e são tantas passagens sensacionais que perdemos a vontade de desvendar a trama (que seria o mais importante em um livro detetivesco) querendo apenas apreciar a leitura e o texto. A prova disso é que em alguns momentos o detetive interage com personagens que têm pouca ou quase nenhuma importância para os casos. Mas Raymond Chandler é tão genial e seus diálogos tão brilhantes que ficamos fissurados querendo mais. Se nessas passagens a trama não avança, o autor aproveita para nos revelar um pouco mais sobre o seu protagonista e até mesmo fazer críticas à sociedade americana do pós-Segunda Guerra Mundial, desde comentários sobre política até sobre o mercado editorial. As escolhas dos personagens e a maneira como levam suas vidas ganham uma importância que vai além de encontrar as respostas para os crimes da trama.
Descrito como “um clássico sobre solidão e amizade” (duas palavras dificilmente associadas a tramas detetivescas), “O Longo Adeus” é, acredito, o resultado do crescimento de um maravilhoso personagem. Este é o sexto livro protagonizado por Marlowe e por mais que suas aventuras anteriores não sejam mencionadas, nem tenham importância para a trama, é possível ver como elas foram moldando o personagem. Marlowe é um cara solitário. Um cara que cruza com tipos desprezíveis em quem não pode confiar nem quer ter por perto. Um cara que sabe esperar o pior das pessoas. Um cara durão, de língua afiada e moral impecável. Mas Marlowe é humano e quer se conectar com alguém (o que explica sua amizade quase instantânea com Lennox). Impossível não ficar tocado ao constatar que o detetive está fadado a ficar sozinho e se despedir de todos.
“O Longo Adeus” é um livro profundo, sem perder a ironia. Sua trama avança lentamente, sem que por isso suas cenas percam a agilidade. Já não lembro exatamente como foi a minha primeira leitura, mas a segunda reforçou a genialidade de seu autor, o caráter de Marlowe e deixou a certeza de que uma terceira, em um futuro distante, não estaria fora de cogitação.
Autor: Raymond Chandler
N de páginas: 384
Editora: L&PM
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6 comentários:
Primeira resenha que leio sobre este livro e mesmo que o nome do autor não seja totalmente desconhecido para mim, admito que nunca li nenhuma obra dele.
Mas pelo que entendi, o autor consegue não só trilhar um enredo de e sobre detetives, mas também engloba mais assuntos na mesma trama, trazendo além do ponto de investigações e afins, amizade e até cumplicidade.
E há também um certo ponto de reflexão!
Com certeza se tiver oportunidade, quero sim, conferir!
Beijo
Oi, Mari
Não conheço a escrita do autor.
Mas gostei muito do enredo que mesmo envolvendo crimes, polícia, investigação, gângster, entre outros elementos o autor inseriu na trama uma grande amizade entre os personagens. Pelo título do livro acontece algo entre a amizade como uma perda.
Espero poder ler, beijos.
A cada resenha sua de Chandler fico com vontade de me bater, Mari. Por que não li nada do autor ainda? Simplesmente não sei. E se você chegou a mudar de opinião sobre o livro é porque realmente tem muito a oferecer. Ótima resenha.
Beijos!
Mari!
Não tive oportunidade ainda de ler nenhum dos livros do autor e gostei porque como leio muitos livros com detetive, achei esse diferente e interessante pelo perfil psicológico da personagem que mesmo sendo um 'lobo solitário', busca a amizade das pessoas, mesmo que não tão confiáveis.
cheirinhos
Rudy
Não conhecia o livro, nem o autor.
Não leio muitos policiais, mas fiquei com vontade e curiosidade por esse.
Parece ter uma escrita e desenvolvimento bem original.
Anotado aqui!
bjs
Não conhecia o autor, mas livros que envolve investigações, crimes e o que mais gosto é o desenrolar da història. Por isso gostaria de ler esse livro que parece ser tão bom.
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