segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Porque é o leitor quem faz a leitura

Existem momentos para determinados livros. Acredito nisso porque inúmeras vezes conclui uma leitura sem a sensação de que ela havia atingido seu objetivo e que o problema estava em mim, na maneira como eu li, mais do que no livro em si.

Comecei a perceber isso há alguns anos quando, depois de me arrastar por semanas para ler “Os Homens que não amavam as mulheres”, não gostei da leitura. Na ocasião, meu parecer foi: “É uma boa história, mas o livro é chato.” Por sorte, anos depois, um passeio na biblioteca me despertou a curiosidade de conhecer a história completa. Para isso, decidi reler o primeiro livro da trilogia e qual não foi a minha mudança de opinião. Hoje digo: “O livro é ótimo! Um pouco lento, é verdade, mas ótimo.” O que aconteceu? As frases não mudaram, os personagens não mudaram, a história não mudou. Então o que fez a diferença? Simples: a maneira que eu li. Em alguns casos poderia ter havido até um amadurecimento nessa mudança, mas nesse caso em específico foi mais simples: li mais rápido. Com menos dias envolvidos na leitura, a sensação de que os eventos se arrastavam e nada acontecia se dissipou e eu consegui aproveitar a impactante jornada criada por Stieg Larsson.

Desde então aprendi a esperar pelo momento certo para certas leituras e, na maioria das vezes, tenho dado sorte com isso.

No ano passado, depois de contar os dias ansiosamente para ler “O Labirinto dos Espíritos”, eu tive o juízo de perceber que, com a rotina de trabalho que eu tinha naquele momento, não poderia me dedicar à leitura (ainda mais se tratando de um livro de 700 páginas!). O que fiz foi esperar até o recesso de final de ano e esses meses me recompensaram com uma aventura maravilhosa.

Mais algumas historinhas: um dos meus livros favoritos dos últimos anos, “Sobre meninos e lobos” ficou anos na minha estante até que um dia eu olhei para ele (talvez tenha sido ele que olhou para mim) e disse: “Vem cá. Chegou a sua vez.” Até então, tudo que eu dizia para ele era: “Um dia”. Talvez se eu tivesse lido em outro momento, o livro tivesse sido mais pesado do que eu poderia suportar, mas naquela ocasião foi um choque de realidade tão brutal e envolvente que nunca esqueci seus personagens e seus dramas (e coloquei seu autor na minha lista de favoritos). 

Posso citar também meu caso com “O Morro dos Ventos Uivantes”, que li há uns 12 anos e elegi como um dos meus clássicos favoritos da vida. Desde então tenho vontade de reler, mas nunca arrisquei fazer isso com medo de me decepcionar, de não ver mais a história com os mesmos olhos e perder o encanto, em especial porque, recentemente, o gênero “clássicos” não tem me atraído tanto.

O fato é: uma leitura se faz de mais do que apenas as frases que o autor escreveu e tem muito do leitor que a tem em mãos. Além disso, um leitor se faz da bagagem literária que carrega e os livros que você leu antes interferem no livro que você está lendo agora. Os suspenses que eu devorava há anos hoje me parecem “mais do mesmo”. Talvez o problema não esteja nos livros e sim em mim que já li tramas com os mesmos contornos muitas outras vezes. Por outro lado, posso me arriscar em uma leitura de um gênero que pouco costumo conferir e, mesmo que ele tenha a trama mais batida do gênero, pode me conquistar porque é um mundo novo para mim.

É pela mesma razão que tantas vezes somos acometidos pela tal “ressaca literária”. Às vezes, não é que o livro que você leu depois daquele livro maravilhoso-que-vai-marcar-sua-vida-para-sempre não seja tão bom. É só que você não escolheu o momento certo para a leitura. Não é que aquele outro livro seja fenomenal. É que naquele momento tudo que você queria era uma leitura leve e despretensiosa e não uma obra-prima que Hemingway gostaria de ter escrito. Resultado: o livro acertou você em cheio porque era exatamente o que combinava com o seu momento. Leitor satisfeito. Missão cumprida.

O livro não é apenas a história que ele conta. É a bagagem do leitor que se soma ao universo criado pelo autor. Por isso mesmo, o livro é mutável. Os acontecimentos podem ser os mesmos, mas a história não será a mesma caso lida em outro momento. Porque livros têm vida e quem dá isso a eles somos nós, leitores.

18 comentários:

Gabriela CZ disse...

Concordo e muito que temos um momento certo pra cada leitura, Mari. Por isso gosto de ter vários gêneros disponíveis e escolher conforme meu momento e humor. Tive sorte de estar bem para uma leitura extensa quando recebi o meu Labirinto dos Espíritos, mas entendo que você precisou esperar pois já aconteceu comigo. E um que precisei de uma segunda leitura para realmente apreciar foi A Revolução dos Bichos, mas nesse caso acho que era muito nova na primeira vez. Bem, acho que poderia conversar um dia inteiro sobre o assunto. Ótimo texto.

Beijos,
Gabi

Nessa disse...

OI Mari
Ótima reflexão, e também acho que te o tempo certo para ler determinados livros. Tenho vários livros aqui que eu quero reler e alguns que eu não consegui concluir. Adorei o post.

Beijinhos
http://diariodeincentivoaleitura.blogspot.com.br

Carolina Santos disse...

Concordo com você em relação a isso quem muda é o leitor não a história é por isso que eu gosto de rever livros que eu não gostava antes na maioria das vezes minha opinião forma outra então é interessante essa ideia

RUDYNALVA disse...

Mari!
Concordo demais com tudo que disse e acrescento apenas que cada pessoa tem suas próprias vivências pessoas e podem ser afetadas de maneira diferente por cada livro, porque sua visão é referente aquele momento que está passando e traz o subconsciente de toda sua existência, e, por isso, cada leitor tem um prisma diferenciado sobre cada livro ou leitura.
Dando apenas um exemplo: tenho visto muito pelos blogs, alguns comentários mais feministas sobre determinados livros, algumas pessoas até indignadas porque o autor teve atitudes machistas, etc...mas, não observam a época em que foi escrito, o contexto geral da história e por aí vai, mas como estamos na época do empoderamento feminino, aquilo se torna revoltante para determinados leitores mais passionais em relação ao assunto. Veja! Não estou levantando a bandeira a favor do machismo, não é isso, é apenas um exemplo do que ando observando...porque como falou: É O LEITOR QUE FAZ A LEITURA...
Desejo uma ótima semana, cheia de luz e paz!
“Que o novo ano que se inicia seja repleto de felicidades e conquistas. Feliz ano novo!” (Desconhecido)
cheirinhos
Rudy
1º TOP COMENTARISTA do ano 3 livros + Kit de papelaria, 3 ganhadores, participem!

Ludyanne Carvalho disse...

Concordo. Às vezes não estamos no clima para determinada leitura ou momento não favorece; dependendo da história é sempre bom dar uma chance.

Beijos

Diego disse...

Olá, Mari. Tudo bem?
Acho válida demais essa reflexão sobre livros e momentos de leitura. Também já tive sensações de odiar um livro num momento e em seguida enxergá-lo com outros olhos e com o coração mais aberto. Mas acredito que isso tem mais a ver como nosso amadurecimento mesmo. POr exemplo, acabei de ler Mrs. Dalloway, de V. Woolf, consegui enxergar uma história linda, mas não me conectei com a história. Tentarei ler mais tarde e talvez tenha amadurecido mais para fazer a leitura. E sobre o momento certo, como saber?

Bjão.
Diego, Blog Vida & Letras
www.blogvidaeletras.blogspot.com
Instagram: @vidaeletras

Casos Acasos e Livros disse...

Oi, Mari.
Estou aplaudindo de pé seu post!
Siiiiiiiim, é o que eu sempre acho.
Há momentos para a leitura, por isso eu nunca pego livros aleatoriamente na minha estante.
E mesmo assim de vez em quando a gente erra.
E quando todo mundo diz que é incrível, mas para você simplesmente é meio blé?
Pode ser só o seu momento.
Adorei.

Beijoooos

www.casosacasoselivros.com

Ana I. J. Mercury disse...

Que texto magnífico, Mari!
Concordo com tudo o que disse!
Parabéns, arrasou como sempre! ;)
Realmente, eu percebo bem isso da nossa bagagem como leitores contar, quando vou reler, principalmente, livros que amei a 1x que li, e ao reler, já não gosto muito. Ou acabo até detestando!
Acho que tem muito da experiência que adquirimos com os anos também, como você disse, a gente lê tanto de um determinado gênero, que acaba ficando todos muito aparecidos e clichês em nossa mente, mesmo que não o seja de fato.
bjão

Ju disse...

Oi Mari, que texto incrível. Tenho que concordar com cada palavra. Apesar de nunca ter organizado meus pensamentos dessa forma para chegar à mesma conclusão, acho que, empiricamente, já tinha essa mesma percepção. Tanto que tenho evitado ler livros do mesmo gênero seguidos, porque um acaba ofuscando o outro. Assim, tenho intercalado livros de suspense com mais levinhos, como romances ou até mesmo algo mais fofinho e adolescente. Dessa forma, cada um vem em seu momento próprio, equilibrando a balança e sem ser ofuscado pelo anterior, por serem bastante diferentes entre si. Acho que a frase de Zafón, de que o livro é um espelho da alma, é mais ou menos isso que você disse: a gente só consegue enxergar conforme nosso momento.

Beijos

Alison Teixeira disse...

Olá, nunca tinha parado para pensar sobre isso, mas essa vertente faz todo o sentido. Às vezes quando estou passando por um momento ruim ou quando estou ansioso sinto que não consigo absorver tudo o que o livro quer passar. Vou tentar usar essa técnica. Beijos.

devorador de letras disse...

Olá Mari, tudo bem?

Gostei demais desse post, na minha opinião, não é o seu caso, muitas pessoas querem ler um livro rápido demais, alguns blogueiros principalmente, esse é o problema, na pressa não curtem a história, você tem que ler com calma, uns livros a leitura flui mais rápido outros não faz parte, mas muitos não entendem isso....bjs.


http://devoradordeletras.blogspot.com.br/

Caverna Literária disse...

Oi, Mari!

Que sucessooooo de texto! Nossa, adorei muito o seu post, concordo com tudo o que você disse. Se não estamos no clima pra aquele livro, é melhor nem começarmos pra não prejudicarmos a experiência com a obra. Um exemplo bobo, teve uma vez que eu tava doente, acho que gripada só, com dor de cabeça e tudo, e li um livro do Rick Riordan e não gostei, sendo que amo os livros dele, e depois percebi que não foi bem o livro que não me agradou, eu não estava me sentindo bem e isso influenciou na leitura. Coisa boba, mas vários fatores podem interferir na leitura e no fato de gostarmos ou não da história. E também vejo isso de achar mais do mesmo após ler muito do mesmo gênero. O problema não é o livro, e sim a gente que já leu demais aquele estilo e já imagina tudo o que vai acontecer. Nós mesmos que tiramos a graça hahaha

xx Carol
http://caverna-literaria.blogspot.com.br

Marta Izabel disse...

Oi, Mari!
Super concordo com que você falou em gênero, número e grau!! Também acho de que tem tempo para tudo até para ler um bom livro, tem vezes que simples estamos focados em outra coisa e acabamos não apreciando corretamente a leitura que estamos fazendo então simplesmente não é momento certo para fazer aquela leitura.
Bjooss

Nana Barcellos disse...

Oi Mari,
Que texto lindo. Ah, e mais lindo é que você curtiu Labirinto dos Espíritos, amei demais! Alicia maravilhosa.
Há tantos livros que eu torcia o nariz na época de escola, que hoje em dia penso em dar uma nova chance. Creio que para alguns funcione. Também tenho receio de reler coisas daquela época, pq teria um olhar mais crítico e detonar a magia hahaha

bjs
Nana - Canto Cultzíneo

Thalita Branco disse...

Olá Mari!
Amei o seu texto! O Morro dos Ventos Uivantes é um que eu adoraria reler. Quando li detestei, mas só depois passei a realmente apreciar os clássicos, então é um que acredito que gostaria hoje em dia.
Bjs

EntreLinhas Fantásticas

Entre Histórias disse...

Oii Mari, tudo bem ? Concordo com você, as vezes deixamos de aproveitar um livro porque não estávamos no momento certo pra ler, temos que ir no nosso ritmo, a leitura tem que ser prazerosa, sem pressão.
-Beijos,Carol!
http://entrehistoriasblog.blogspot.com.br/

Sil disse...

Olá, Mari.
Eu acredito nisso também. Quantas vezes já peguei um livro para ler e senti que não era a hora certa e deixei para depois e acabei amando a leitura. talvez se tivesse lido naquela hora nem tivesse gostado. E até por isso procuro intercalar livros do mesmo gênero. Porque as vezes gostamos tanto do que lemos primeiro e dai acabamos achando defeitos no lido em seguida. Defeitos que não veríamos se ele tivesse sido lido em outra hora.

Prefácio

Sora Seishin disse...

Oi Mari!
Concordo com você que existem momentos para determinados livros! Eu detestava os clássicos, mas agora estou lendo e curtindo as leituras... Percebi que eu não tinha maturidade o suficiente antes, para entender as histórias.
Ah, estou lendo O Labirinto dos Espíritos agora e estou adorando!

Beijos,
Sora | Meu Jardim de Livros

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