“Sangue começou a fluir, com todo o vagar, de sua bochecha, saído de um buraco acima de seu olho esquerdo. Depois fluiu mais rápido. O buraco ficou maior, e vermelho. Os olhos de Joey Chill fixavam o teto estupidamente, como se aquelas coisas não tivessem mais nada a ver com ele.” (CHANDLER, 2009, p.63)
Raymond Chandler é sinônimo de literatura policial de qualidade. Seu nome não apenas é associado aos grandes, mas também aqueles que foram o marco de uma nova vertente: o noir.
Composto por quatro contos e um ensaio “A Simples Arte de Matar – Volume 1” é a primeira parte de uma antologia de textos capazes de mostrar que todas as marcas que o autor empregaria em seus futuros romances já estavam presentes em seus primeiros escritos: a ironia, os personagens que transitam entre o certo e o errado, as tramas imprevisíveis e as descrições brilhantes.
Se nos romances de Raymond Chandler as histórias se ramificam, vão e voltam, nos contos elas apenas vão – para um lugar inesperado. Em “Sangue Espanhol” fotos comprometedoras, política e chantagens estão no caminho da investigação do detetive Sam Delaguerra. Em “Vou Estar Esperando” uma mulher à espera do ex-marido que acabou de sair da prisão capta o olhar do detetive do hotel Tony Reseck. Os corredores de hotéis também são o cenário inicial de “O Rei de Amarelo” onde um músico de passagem pela cidade é pego em uma trama de vingança que será desvendada pelo detetive Steve Grayce. “Pérolas são um incômodo” coloca o apaixonado Walter em busca de um colar de pérolas roubado da chefe de sua noiva.
É visível, para quem já conhece a obra do autor, que os protagonistas destes contos apresentam, cada um a seu modo, características daquele que seria o seu personagem mais notável: Philip Marlowe. Poder observar isso é uma das razões que me levam a recomendar esse livro apenas para quem já está familiarizado com os romances de Chandler, mesmo que alguns destes contos tenham sido escritos antes do início de suas excursões como romancista. Outra razão é que, por mais que essas histórias curtas tenham a essência do autor e mantenham até mesmo a narrativa em primeira pessoa, nenhuma delas é capaz de cativar da mesma maneira e eu atribuo isso à falta que Marlowe faz.
Por outro lado, as histórias podem ser lidas fora de ordem e mesmo com longos intervalos entre si, já que se trata de histórias independentes. Isso talvez seja interessante para quem quer começar a conhecer esse autor - que não escreve tramas para serem devoradas nas madrugadas - aos poucos, embora, ressalto, isso seja apenas uma pequena prova do que ele é capaz de fazer.
Quando leio Raymond Chandler sempre sou presenteada com trechos e frases que me fazem interromper a leitura para dizer em voz alta “Ah.. Mr. Chandler.. Você é mesmo um gênio”. O mais fascinante é observar como seus textos exprimem uma identidade que jamais poderia ser tomada como sendo de outro autor. Muitos que vieram depois – Dennis Lehanne, por exemplo – são comparados a ele, mas a verdade é que um texto assinado por Chandler pode ser reconhecido à distância, já que o autor emprega sua identidade e sua visão em cada frase.
Essa visão é a essência do ensaio que dá título à coletânea “A Simples Arte de Matar” na qual o autor reflete a respeito da literatura policial já sendo um autor consagrado do gênero (apenas 5 anos após a publicação de “O Sono Eterno”, seu primeiro romance). Entre os assuntos que aborda estão o que é apresentado como textos do gênero e as recepções que têm (tanto de público como de crítica), o ofício de escrever e a contribuição de sua experiência como detetive particular para com caráter realista de suas tramas. Não existem pessoas boas e inocentes envolvidas no mundo dos crimes cujos cenários não são casas de campo e sim ruas, becos e hotéis duvidosos. Por isso não é à toa, ou com pouco conhecimento de causa, que o autor critica alguns de seus colegas (não poupando nem mesmo a fabulosa Agatha Christie, embora suas críticas à Dama do Crime sejam bem menos severas que a outros autores). O autor também reflete sobre como deveria ser um detetive particular, o que, é claro, é um perfeito reflexo do seu magnífico Philip Marlowe.
“Nas ruas sórdidas da cidade grande precisa andar um homem que não é sórdido, que não se deixa abater e que não tem medo. Neste tipo de história o detetive deve ser este homem. Ele é o herói; ele é tudo. Ele deve ser um homem completo e um homem comum e, contudo, um homem fora do comum. (...) Se houvesse outros como ele, o mundo seria um lugar mais seguro para se viver, sem que com isso se tornasse desinteressante a ponto de não valer a pena viver nele.” (p.26-27)
“A Simples Arte de Matar” não é o que eu considero um início ideal para quem nunca leu Raymond Chandler. Mas se você gosta de literatura policial e se enquadra nessa categoria, comece em algum lugar. O que importa é conhecer esse autor.
Título: A Simples Arte de Matar – Volume 1
Autor: Raymond Chandler
Nº de páginas: 772
Editora: L&PM
Raymond Chandler é sinônimo de literatura policial de qualidade. Seu nome não apenas é associado aos grandes, mas também aqueles que foram o marco de uma nova vertente: o noir.
Composto por quatro contos e um ensaio “A Simples Arte de Matar – Volume 1” é a primeira parte de uma antologia de textos capazes de mostrar que todas as marcas que o autor empregaria em seus futuros romances já estavam presentes em seus primeiros escritos: a ironia, os personagens que transitam entre o certo e o errado, as tramas imprevisíveis e as descrições brilhantes.
Se nos romances de Raymond Chandler as histórias se ramificam, vão e voltam, nos contos elas apenas vão – para um lugar inesperado. Em “Sangue Espanhol” fotos comprometedoras, política e chantagens estão no caminho da investigação do detetive Sam Delaguerra. Em “Vou Estar Esperando” uma mulher à espera do ex-marido que acabou de sair da prisão capta o olhar do detetive do hotel Tony Reseck. Os corredores de hotéis também são o cenário inicial de “O Rei de Amarelo” onde um músico de passagem pela cidade é pego em uma trama de vingança que será desvendada pelo detetive Steve Grayce. “Pérolas são um incômodo” coloca o apaixonado Walter em busca de um colar de pérolas roubado da chefe de sua noiva.
É visível, para quem já conhece a obra do autor, que os protagonistas destes contos apresentam, cada um a seu modo, características daquele que seria o seu personagem mais notável: Philip Marlowe. Poder observar isso é uma das razões que me levam a recomendar esse livro apenas para quem já está familiarizado com os romances de Chandler, mesmo que alguns destes contos tenham sido escritos antes do início de suas excursões como romancista. Outra razão é que, por mais que essas histórias curtas tenham a essência do autor e mantenham até mesmo a narrativa em primeira pessoa, nenhuma delas é capaz de cativar da mesma maneira e eu atribuo isso à falta que Marlowe faz.
Por outro lado, as histórias podem ser lidas fora de ordem e mesmo com longos intervalos entre si, já que se trata de histórias independentes. Isso talvez seja interessante para quem quer começar a conhecer esse autor - que não escreve tramas para serem devoradas nas madrugadas - aos poucos, embora, ressalto, isso seja apenas uma pequena prova do que ele é capaz de fazer.
Quando leio Raymond Chandler sempre sou presenteada com trechos e frases que me fazem interromper a leitura para dizer em voz alta “Ah.. Mr. Chandler.. Você é mesmo um gênio”. O mais fascinante é observar como seus textos exprimem uma identidade que jamais poderia ser tomada como sendo de outro autor. Muitos que vieram depois – Dennis Lehanne, por exemplo – são comparados a ele, mas a verdade é que um texto assinado por Chandler pode ser reconhecido à distância, já que o autor emprega sua identidade e sua visão em cada frase.
Essa visão é a essência do ensaio que dá título à coletânea “A Simples Arte de Matar” na qual o autor reflete a respeito da literatura policial já sendo um autor consagrado do gênero (apenas 5 anos após a publicação de “O Sono Eterno”, seu primeiro romance). Entre os assuntos que aborda estão o que é apresentado como textos do gênero e as recepções que têm (tanto de público como de crítica), o ofício de escrever e a contribuição de sua experiência como detetive particular para com caráter realista de suas tramas. Não existem pessoas boas e inocentes envolvidas no mundo dos crimes cujos cenários não são casas de campo e sim ruas, becos e hotéis duvidosos. Por isso não é à toa, ou com pouco conhecimento de causa, que o autor critica alguns de seus colegas (não poupando nem mesmo a fabulosa Agatha Christie, embora suas críticas à Dama do Crime sejam bem menos severas que a outros autores). O autor também reflete sobre como deveria ser um detetive particular, o que, é claro, é um perfeito reflexo do seu magnífico Philip Marlowe.
“Nas ruas sórdidas da cidade grande precisa andar um homem que não é sórdido, que não se deixa abater e que não tem medo. Neste tipo de história o detetive deve ser este homem. Ele é o herói; ele é tudo. Ele deve ser um homem completo e um homem comum e, contudo, um homem fora do comum. (...) Se houvesse outros como ele, o mundo seria um lugar mais seguro para se viver, sem que com isso se tornasse desinteressante a ponto de não valer a pena viver nele.” (p.26-27)
“A Simples Arte de Matar” não é o que eu considero um início ideal para quem nunca leu Raymond Chandler. Mas se você gosta de literatura policial e se enquadra nessa categoria, comece em algum lugar. O que importa é conhecer esse autor.
Título: A Simples Arte de Matar – Volume 1
Autor: Raymond Chandler
Nº de páginas: 772
Editora: L&PM
7 comentários:
Nem sei quantas vezes já disse isso aqui, mas preciso começar a me aventurar pela literatura policial. O problema é que não sei por onde. Mas foi bom você avisar pra não começar por esse, Mari. Apesar de ter me interessado, senti que preciso conhecer melhor o gênero e o autor antes. Ótima resenha.
Abraço!
http://constantesevariaveis.blogspot.com.br/
Olá!
Sou apaixonada por romances policiais. Você falou tão bem que, em breve, procurarei alguns livros do autor. Parabéns pela resenha.
Abraços.
Entre Livros e Livros.
http://musicaselivros.blogspot.com.br/
ahhh amém um blog literário obrigada, estou super, mega interessada nesse livro.
estou entrando no mundo do blog agora e gostaria muito de ter todas vocês como colegas, aposto que vcs gostaram, sego todas de volta.
BLOG: heyqmem.blogspot.com.br
Oi Mari!
Não conhecia o autor mas sou fã de romances policiais. Vou procurar os livros dele e ver por qual começar.
Beijos,
http://www.epilogosefinais.com/
Ainda não conheço a escrita de Chandler, mas gostaria de conhecer. Confesso que ele perdeu alguns pontinhos comigo ao fazer umas críticas a grande diva Agatha Christie, mas vou tentar ser bem imparcial quando for ler algo dele.
Seguidor: DomDom Almeida
@_Dom_Dom
Mari!
Que análise 'apaixonada' pelo autor e acho isso importante ao lermos uma obra, porque nos envolve totalmente apenas por ser de um escritor que admiramos.
Pelo que percebi o livro é diferenciado por ser um conto/ensaio falando sobre crimes e não especificamente um livro policial e mais uma vez, admirável!
Parabéns por sua análise.
cheirinhos
Rudy
Blog Alegria de Viver e Amar o que é Bom!
Nossa! fiquei boba! você ama mesmo o trabalho deste autor né? Bom eu ainda não tinha ouvido falar dele mas estou bastante curiosa a respeito do seu trabalho. Eu sou uma pessoa que em um certo "preconceito" de historias com detetive e policiais mais este você falou tão bem que fiquei com a pulga atras da orelha e também né é de contos que estou falando eu simplesmente AMO conto! acho uma coisa tão boa contos com suas historias breves e diretas. Beijos <3
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