domingo, 29 de outubro de 2017

RESENHA: Zero K

Zero K / Don Delillo / Ficção Científica
Premissas de ficção científica quase sempre abrem espaço para interessantes questionamentos quando o cerne da trama não está na tecnologia e sim nas repercussões desta e nos conflitos existenciais que surgem a partir de determinado cenário tecnológico. E foram os inúmeros conflitos por trás de “Zero K” que me atraíram. A decepção foi tão grande quanto a promessa.

Jeffrey Lockhart é chamado por seu pai para se despedir de sua madrasta, Artis. Depois de uma longa doença, ela está se aproximando da morte. Mas o que Jeffrey não esperava era que ela escolhesse escapar desse destino congelando seu corpo em uma cápsula criogênica, um experimento que vem sendo financiado por seu pai. É assim que Jeffrey se depara com o Projeto Convergência, uma iniciativa tecnológica que assume ares de seita e que faz com que ele questione o que é a vida e qual o peso da certeza da morte nas nossas escolhas.

A premissa de “Zero K” é interessantíssima. Afinal, como viveríamos caso morrer fosse uma opção? Como viveríamos se pudéssemos apenas interromper a vida, em qualquer momento, e voltarmos a ela no futuro? Ou, até mesmo, não voltar? Simplesmente viver até certo ponto e se retirar de cena? As questões não param por aqui. É a certeza da morte que nos faz querer aproveitar o máximo da vida? Pausar a vida para evitar morrer não é uma espécie de morte? Se um conhecido seu não morre, é apenas congelado, isso aplaca de alguma forma o sentimento de perda se ele poderá ser descongelado apenas em um futuro muito distante no qual você talvez já não esteja aqui? E quando essas pessoas voltarem para a sociedade, como elas serão recebidas? Como irão se integrar em um mundo que continuou vivendo sem elas? Interessante. Tudo muito interessante.

“Solidão in extremis. Pense na palavra inglesa: alone. Do inglês médio, all one. Todo, um. Você se despe da pessoa. A pessoa é a máscara, o personagem criado no pot-pourri de dramas que constitui a vida. Cai a máscara, e a pessoa se transforma em você no sentido verdadeiro. Todo um. O eu. O que é o eu? Tudo que você é, sem os outros, nem amigos nem estranhos nem namorados nem filhos nem ruas para percorrer nem comida para comer nem espelhos em que se ver. Mas será que você é alguém sem os outros?” (DELILLO, 2017, p.67)

O problema de “Zero K” é que o livro é tão gelado que parece ter ele mesmo sido congelado para voltar à vida depois, sem nunca ter voltado. O protagonista não é nada carismático e em nenhum momento eu consegui me importar com seus dilemas (todos muito genéricos), nem com os seus conflitos diante da escolha “aceitável” da madrasta, mas “totalmente inaceitável” do pai (um homem saudável que decide se congelar para ficar com a esposa).

Muitas vezes eu digo que livros de ficção científica tendem a ser gelados, afinal, costumam ser cenários muito distantes da nossa realidade com os quais nem sempre é fácil nos conectarmos. Mas isso não quer dizer que não funcionem, muito pelo contrário, já que essa estranheza é fundamental para algumas tramas. Mas em “Zero K” o cenário se torna maior que os personagens e isso é fatal, tornando-o aquele tipo de livro que entedia, mas que você continua lendo porque sabe que, em alguns momentos, irá se deparar com conceitos interessantes e com frases que proporcionarão alguma reflexão. Mas isso não é suficiente, pois, a meu ver, um livro se sustenta, em primeiro lugar, com bons personagens. Se não houver empatia, mesmo a melhor premissa escorre pelo ralo e, infelizmente, é isso que acontece com “Zero K”.

Título: Zero K
Autor: Don Delillo
N° de páginas: 272
Editora: Companhia das Letras

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16 comentários:

Sil disse...

Olá, Mari.
Eu sou meio cegueta e quase que não enxergo essa capa hehe. Achei o tema interessante, pena que os personagens não ajudaram. Acredito que o pior é a ausência, então mesmo que não morra, mas não tem contato é uma espécie de morte.

Prefácio

Sora Seishin disse...

Oi Mari!
Eu adoro ficção científica! Ainda não conhecia esse livro e a sinopse é mesmo interessante. Pena que o autor não soube trabalhar bem com os personagens.

Beijos,
Sora | Meu Jardim de Livros

Nicole Longhi disse...

Eu fiquei uns 10 minutos procurando a capa, e só depois que fui perceber haha
Achei uma premissa muito boa e é uma pena que o autor tenha decepcionado, porque ele realmente tinha uma boa trama em mãos.
Por mais que se trata de uma ficção, o autor podia ter sido um pouco menos frio.

Jessica Andrade disse...

Oi Mari,

Que pena que o livro não foi tudo isso, realmente se os personagens não forem interessantes a história não anda.

Bjs
http://diarioelivros.blogspot.com.br/

Gabriela CZ disse...

Devo dizer que adorei sua menção de que o livro é tão frio que parece ter sido congelado, Mari. Seus comentários transparecem bem os motivos da sua decepção, e eu também me decepcionaria. Não conhecia o livro, e também não me instigou. Enfim, ótima resenha.

Beijos!

Paula disse...

Oi Mari,
Estou começando a pegar gosto pelas ficções científicas por todos os questionamentos que ele nos faz pensar. Esse é um daqueles livros que a gente pensa, poderia ser melhor. Concordo com tudo que vc disse, não adianta de nada a ideia central do livro ser ótima e os personagens não serem cativantes. Adoro suas resenhas sinceras!
Um beijo
Paulinha S

Marta Izabel disse...

Oi, Mari!!
Não conhecia essa estória mas a proposta dela é bem interessante!! Pena que o Don Delillo não soube explorar bem essa estória maravilhosa!!
Bjoss

Mari Zavisch disse...

Oi, Mari!
Vim ver a resenha pela premissa do livro e já percebi que não vai entrar para a minha wishlist.
Concordo com você: os personagens são fundamentais mesmo em um mundo tão "inaceitável" quanto os de ficção cientifica.
É horrível quando nos decepcionamos com algo que estávamos com tanta vontade de ler :(
Beijinhos,

Galáxia dos Desejos

Na Nossa Estante disse...

Oi Mari, realmente levanta boas questões, uma pena ter decepcionado, mas acho que a capa parece de acordo com vc o que vc falou, gelada, bem feia aliás rsrsrsrsrs

Bjs, Mi

O que tem na nossa estante

RUDYNALVA disse...

Mari!
A premissa realmente é muito boa e interessante e digo mais, não é tão longe de acontecer não, pois os estudos sobre criogenia crescem e evoluem a cada ano...
Fato é ver esa ficção ser diluída a quase nada devido a seus protagonistas e a falta de censo do escritor.
Uma pena!
Desejo uma semana maravilhosa e florida!
“Para saber uma verdade qualquer a meu respeito, é preciso que eu passe pelo outro.” (Jean-Paul Sartre)
Cheirinhos
Rudy

Mariele Antonello disse...

Eu não conhecia este livro, gosto de livros de ficção científica, uma pena que a história deste livro acabou se tornando uma decepção para você, lendo um pouco mais sobre este livro em sua resenha, percebi que teria diversos pontos que me incomodariam na história, então no momento não pretendo ler Zero K.

Ana I. J. Mercury disse...

Não conhecia o livro, e não sou muito de ler ficção científica não.
Se você não curtiu muito, Mari, então sei que também não gostarei, ainda mais eu que quase nunca leio o gênero.
Mas confesso, achei interessante isso tudo sobre a morte.
beijinhos.

Alessandra Salvia disse...

Oi Mari,
Como seria se morrer fosse uma opção? Que interessante, algo bem diferente do que já li. Fiquei curiosa.
Quero ler!
Beijo
http://estante-da-ale.blogspot.com.br/?m=1

ThermIso disse...

Oiiiii.....
Realmente a Sinopse e muito interessante tipo cápsula criogênica...massa...mas vc não falou muito bem do livro e me desanimou pós eu gosto muito de ficção cientifica....nao sei se vou ler não....
Acho que é isso...
Bjs

devorador de letras disse...

Olá Mari,

Esse é mais um livro que fio conhecendo aqui, capa muito ruim de ver....kkk...mas enfim, gosto do gênero, mas concordo com a sua ressalvas e fica difícil de querer ler o livro....bjs.


http://devoradordeletras.blogspot.com.br/

chicoary disse...

Gostei muito do DeLillo em Ruído Branco (Ver https://chicoary.wordpress.com/2017/10/28/ruido-branco/)

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