sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

RESENHA: O Quarto de Giovanni

quarto de giovanni james baldwin
David é um jovem americano que vive em Paris e aguarda o retorno de Hella, sua namorada, da Espanha. Sem saber como responder ao pedido de casamento de David, ela viaja para longe a fim de colocar seus pensamentos em ordem. Sozinho na capital francesa, ele conhece Giovanni e a conexão que ambos desenvolvem levará David a questionar e a temer seus próprios sentimentos. 

O Quarto de Giovanni alterna-se em dois momentos: o presente, em que David está sozinho no sul da França e não consegue parar de ruminar sobre o que aconteceu; e o passado, no qual conhecemos mais a fundo Giovanni e a estória deles. 

O livro é narrado em primeira pessoa por David e desde o início sentimos a angústia do personagem, não apenas por seu desconforto em aceitar-se como é, mas também pela culpa que carrega e que o consome. E este é o fio condutor da estória: entender de onde vem essa carga tão pesada que o protagonista carrega. 

Impossível falar sobre O Quarto de Giovanni e não elogiar os personagens criados por Baldwin. David conta com uma profundidade psicológica espantosa, de modo que conseguimos entender exatamente o porquê de seus pensamentos e ações, bem como sua dificuldade em aceitar seus sentimentos. Giovanni também é bem desenvolvido, sendo que seu charme e fragilidade também cativam ao leitor. 

“Talvez, como dizemos nos Estados Unidos, eu quisesse me encontrar. É uma expressão interessante, que até onde sei não é corrente nos idiomas de outros povos, que certamente não significa o que quer dizer ao pé da letra, porém trai uma suspeita incomoda de que alguma coisa está fora do lugar. Hoje, creio que, se na época eu fizesse ideia de que o 'eu' que ia terminar encontrando acabaria sendo o mesmo do qual havia passado tanto tempo fugindo, teria ficado na minha terra. Por outro lado, acho que, no fundo do coração, sabia muito bem o que estava fazendo quando peguei o navio que ia me levar à França.” (BALDWIN, 2018, p. 47)

O romance deles é intenso, mas ao mesmo tempo instável e doloroso. David tem vergonha da sua sexualidade e de seu desejo por Giovanni, sabe que o ama e que é amado, mas tem medo de se entregar completamente a este amor, pois o considera imoral. Cabe salientar que o livro foi publicado em 1956 e se hoje podemos achar que a temática da aceitação é um clichê quando se fala em literatura LGBT, naquela época certamente não era. Ainda assim, Baldwin faz um trabalho tão bem feito que, mesmo que já tenhamos visto esse tipo de estória outras vezes, nos envolvemos rapidamente com a obra.. 

Vale salientar que, justamente por ser um livro publicado pela primeira vez há mais de sessenta anos, Baldwin tem muito cuidado com as descrições. Assim, a única demonstração de afeto físico que é descrita foi um abraço, por exemplo. Mas isso não impediu o autor de deixar claro o amor deles tanto nas digressões do protagonista, quanto nos diálogos entre os personagens. 

Impossível não se impressionar com o texto de Baldwin, que é revestido de sentimento. Além disso, suas reflexões sobre os mais variados assuntos são tão profundas e tão marcantes que emocionam o leitor. Para se ter uma ideia, marquei oito citações — provavelmente meu recorde para um livro tão curto — e confesso que foi difícil escolher uma delas para colocar nessa resenha. 

Muito mais do que um livro LGBT, O Quarto de Giovanni é uma obra que dialoga abertamente sobre a dor. A dor de amar, a dor de se arrepender, a dor de se sentir impotente, a dor de não saber como agir, a dor de machucar, a dor de não sentir, a dor de estar perdido, a dor de não saber quem você realmente é. Uma leitura triste, impactante e emocionante, que certamente me deixou interessado em conhecer o restante da obra de Baldwin. 

Título: O Quarto de Giovanni
Autor: James Baldwin
N.º de páginas: 229
Editora: Companhia das Letras
Exemplar cedido pela editora

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12 comentários:

Rubro Rosa disse...

Como é gostoso ver que livros assim, antes considerados aberrações, hoje estão nas mãos e estantes de tantos leitores!
Depois que li Me Chame Pelo Seu Nome,comecei a adorar o tema e com isso, abrir o coração para o amor, simples assim.
Sem preconceitos, sem pudores, apenas amor. Não de uma forma baixa, mas sim, com ternura, doçura e sensibilidade.
Por isso, tudo que li acima foi lindo. Uma resenha que traduz muito bem o conteúdo da história e sem sombra de dúvidas, o livro vai para a lista de desejados!!
Beijo

Unknown disse...

Oi Alê.
Eu adorei a premissa deste livro, e acho tão importante livros com essa temática. É essencial as pessoas aprenderem a olhar um romance LGBT apenas como amor e não outra coisa anormal, e que deve ser evitada ou punida. Quero ler.
Beijos

Luiza Helena Vieira disse...

Oi, Alê!
Eu já tinha visto esse livro por aí, mas não sabia que ele era tão intenso assim. Já está na lista para ser lido.
Beijos
Balaio de Babados

Gabriela CZ disse...

Não conhecia esse livro mas já quero ler, Alê. Um livro escrito há tempo e que aborda a temática LGBT com tal reflexão e sutileza merece ser lido. Ótima resenha.

Beijos!

Denise Flaibam disse...

Oi, Alê! Tudo bom?
Eu vi muitos elogios a esse título e fiquei bem curiosa pra ler algo do autor. Preciso de VONTADE pra ler histórias que carregam mais o emocional, mas espero fazer isso ainda esse ano!

Beijos,
Denise Flaibam.
www.queriaestarlendo.com.br

Ariane Gisele Reis disse...

Oie Alê =)

Confesso que a principio esse livro não tinha me chamado a atenção, mas depois de ler a sua belíssima resenha, fiquei mais do que convencida a dar uma chance ao livro.

Parabéns!

Beijos e uma ótima semana;***
Ane Reis | Blog My Dear Library.

Folhas De Netuno disse...

Oi Alê!
Eu não conhecia esse livro antes, mas com sua resenha acabou me chamando a atenção, ainda mais por ser uma história intensa.

Folhas De Netuno

Ycaro Santana disse...

O Quarto de Giovanni me surpreendeu muito! Adorei a descoberta do David durante a narrativa e a profundidade emocional que o autor dá aos personagens e pensamentos. Adoraria acompanhar essa trama com o desenvolvimento do sentimento dos protagonistas e o simples afeto entre eles.

Sil disse...

Olá, Alê.
Imagino como deve ter sido para o autor escrever esse livro. Se hoje já é tão dificil falar do assunto, imagine naquela época então. Mas ainda assim não é um livro que tenha me chamado tanto a atenção, por isso acho que não lerei.

Prefácio

Ana I. J. Mercury disse...

Já li várias resenhas de livros do autor, mas desse livro ainda não. Muito interessante o tema, e imagino como o autor deve ter tido dificuldades para falar de um tema que infelizmente gera tanta polêmica, naquela época tão cheia de tabus.
Parece ser uma leitura emocionante, dolorosa e verdadeiríssima.
Já quero!
bjs

Carolina Santos disse...

Eu adorei a proposta desse livro e como eu adoro livros com temática LGBT eu fiquei muito impressionado e curiosa em conferir esse lançamento que já está na minha lista de desejos

Luana Martins disse...

Oi, Alê
Eu adorei esse livro e pelo ano em que foi escrito ainda é tão atual nos dias de hoje.
Além de abordar um homem que se apaixona por outro ainda tem a dores que o personagem carrega.
Quero muito ler, mas a capa não agrada tanto assim. Trás um post só com os quotes.
Beijos

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