terça-feira, 21 de janeiro de 2014

RESENHA: Pelos Olhos de Maisie

“Queriam-na não pelo bem que pudessem fazer a ela, mas pelo mal que, com a ajuda inconsciente dela, cada um poderia fazer ao outro. Ela serviria a seus ódios e selaria suas vinganças (...)” (JAMES, pag. 35, 2010) 

Uma história contada pelo ponto de vista de uma criança que mesmo sendo o personagem central para o leitor, não é exatamente o centro dos acontecimentos da trama. Foi isso o que me atraiu em “Pelos Olhos de Maisie”, clássico de Henry James. 

Após o divorcio dos pais, fica determinado que a guarda de Maisie não caberá a um nem a outro e sim aos dois alternadamente. A menina deverá passar seis meses na casa da mãe (onde ouve os maiores insultos a respeito do pai) e depois seis meses na casa do pai (onde ouve sobre a mãe tantos insultos quanto a mesma profere sobre o ex-marido) até que volte para a casa da mãe novamente. Mas o ex-casal está muito mais preocupado em ferir um ao outro do que em cuidar da filha. 

Existem exemplares maravilhosos na literatura onde o personagem que nos conta a história não é o centro dela. É o caso, por exemplo, de “O Grande Gatsby”, de F. Scott Fitzgerald, cujo narrador em primeira pessoa, Nick Carraway, é apenas uma testemunha da história principal, o romance de Jay Gatsby e Daisy Buchanan. O que “Pelos Olhos de Maisie” traz é algo diferente e muito interessante de ser acompanhado. É o caso de uma narrativa em terceira pessoa, realizada por um narrador que por vezes dialoga com o leitor - se referindo a Maisie como “nossa amiga” ou até “nossa heroína˜ - mas que se propõe a contar a história pelo olhar da menina, de forma que o leitor só tem conhecimento daquilo que ela tem conhecimento, das cenas e diálogos que ela presencia. É por isso que o título do livro é tão apropriado, pois o que acompanhamos é a história dos relacionamentos entre os adultos - mais do que a história da própria Maisie - mas pelo olhar dela. 

De fato, é admirável o que Henry James alcançou dentro desta proposta, visto que mesmo mostrando apenas o que Maisie vê, o autor consegue fazer com o que o leitor saiba muito mais do que ela. Maisie vê, mas seu olhar inocente de criança não lhe permite compreender tudo. Já o leitor, adulto, processa as informações com outra mente. 

E existe muito o que processar, já que depois do divórcio a vida de Maisie vira uma verdadeira bagunça. Esta é uma história de personagens cheios de defeitos vivendo relacionamentos complicados e tortuosos. Tanto o pai quanto a mãe da menina (duas pessoas completamente sem noção) voltam a se casar, de forma que entra em cena também um padrasto, uma madrasta e governantas (que acabam sendo para a menina mais mãe do que a sua própria). Não tendo ao menos certeza de ser amada pelos pais, Maisie vai se afeiçoando a quem lhe dá atenção e nesse jogo de relacionamentos todos tentam virar a menina uns contra os outros. Logo nas primeiras páginas já se percebe que essa é uma histórias de muitos conflitos e, justamente por isso, muito promissora. Embora não nos afeiçoemos a nenhum dos personagens, ainda assim queremos saber como suas histórias irão se desenvolver. Suas fraquezas, conflitos morais, e batalha de egos aliados a uma boa narrativa, temperada com a dose certa de ironia, fazem com que os primeiros capítulos passem ligeiro. 

Porém, se a opção de contar a história pela visão da menina rendeu alguns dos pontos altos da parte inicial, depois fez com que o livro deixasse a desejar, pois se o leitor só sabe o que Maisie sabe é de se esperar que ele não tenha a oportunidade de acompanhar o desenrolar de todos os acontecimentos, afinal, Maisie é uma criança e por isso é natural que não saiba tudo o que acontece entre aqueles personagens. O livro é coerente com a proposta da primeira à última página, mas paga um preço por isso, tornando-se enfadonho em alguns momentos e desanimando a partir da metade.  A meu ver, o problema não esteve nos personagens ou nas relações entre eles, menos ainda na narrativa do autor, e sim nos episódios que constituem a trama, pois é chegado um ponto em que ver as coisas acontecerem em segundo plano deixa de ser tão atrativo e em alguns momentos parece que o que vemos é mais do mesmo.  

Tendo sido publicado em 1897, é claro que o impacto que “Pelos Olhos de Maisie” tem hoje é diferente do que na época de seu lançamento, visto que as configurações familiares já não são como naquele tempo. Mas nem por isso a proposta da história (e a trama em si, mesmo com altos e baixos) deixa de ser interessante. 

Em uma edição que todo o clássico deveria receber, “Pelos Olhos de Maisie” apresenta uma série de textos que contextualizam e enriquecem a obra do autor, entre eles uma introduçāo (que tem o cuidado de avisar o leitor não familiarizado com a história que contém spoilers sobre o enredo. Registro aqui meus parabéns, e agradecimentos, à editora); cinco resenhas escritas à época do lançamento, mostrando a recepção da história em 1897; e uma espécie de diário do próprio Henry James falando sobre as primeiras ideias e a concepção deste livro.

Neste mês, chegou aos cinemas a adaptação cinematográfica de “Pelos Olhos de Maisie” com uma abordagem contemporânea da história. O filme conta com Julianne Moore e Alexander Skarsgard como a mãe e o padrasto da menina. 

Título: Pelos Olhos de Maisie (exemplar cedido pela editora)
Autor: Henry James
N de páginas: 412
Editora: Penguin Companhia

11 comentários:

Ana Paula Barreto disse...

Eu sabia do filmes, mas não tinha ideia de que era uma adaptação.
Tenho interesse na história. Acho que essa proposta de conhecer os acontecimento pelo ponto de vista de uma criança é diferente.
Ainda que alguns pontos tenham se tornado enfadonhos, me parece que em geral é uma boa obra.
bjs

Anônimo disse...

Olá Mari!! Tudo bem??
Não conhecia o livro e fiquei encantada com a historia, pois ler qualquer coisa pelos olhos de uma criança sempre deixa a gente curiosa. E por ele ser um clássico, pretendo realizar a leitura dele. Irei procurar pelo livro, e pela adaptação também!!

Gabriela CZ disse...

Confesso que não conhecia esse livro, mas me interessei pelo enredo. Vou procurar. Ótima resenha.

Abraço!
http://constantesevariaveis.blogspot.com.br/

Mi disse...

Olá! Tudo bem?
Antes de comentar sobre a resenha gostaria de dizer que não conhecia seu blog, mas já gostei! o/ Parabéns pelo trabalho! ;]
Sobre o livro eu não o conhecia e de primeira, olhando só a sinopse, talvez nem me chamasse atenção... Mas você colocou algo que foi "o ponto", rs! O autor mostra ao leitor uma visão, mas quem lê acompanha mais?! Cara, que genial! :O

Beijo!
Mi
Inteiramente Diva

Nardonio disse...

Não sabia da existência desse livro, e muito menos dessa adaptação pro cinema. Mas achei a premissa muito interessante. Só em ler essa resenha, fiquei com muita pena da garota. Mesmo sendo escrito em uma época tão distante, esses problemas são muito atuais, infelizmente. Outra coisa que achei legal foi esse cuidado que a editora teve para o lançamento dessa obra. Parabéns!!!!

Seguidor: DomDom Almeida
@_Dom_Dom

Unknown disse...

nunca tinha ouvido falar nesse livro, mas sim no filme. Gostei da temática do livro e depois de ler a resenha me deu vontade de pesquisar mais sobre ele.

Elis Paulina disse...

Esse livro ainda nem conhecia, muito menos a adaptação. Achei bastante interessante a trama que se desenvolve nesse livro. Parece ser completamente "diferente". *-*, beijos

Mallu Marinho disse...

Já estou interessada nesse livro a u tempo, mas essa resenha foi convincente o bastante pra colocar esse livro na minha lista de prioridades. Nunca li nada com esse estilo de narrador, mas acho que deve ser bem interessante passar por essa experiência literária. "Pelos olhos de Maisie" merece ser lido antes de eu assistir a adaptação, então devo correr pra conseguir. Ótima resenha.

Thais Pampado disse...

Parece ser uma história bem interessante, com uma abordagem no mínimo diferente do que se costuma ver. Não conhecia esse livro, embora já tenha lido um outro do autor (que detestei, o que me desanima um pouco frente a esse).

Heloise Gabrielle disse...

Tou querendo ler esse livro, dizem que é muito bom. Estou super curiosa pra ler!

De papo com Gaby

Adriana disse...

Nossa, esse livro parece ótimo! Infelizmente, acontece tanto isso né, ex casal tentando ferir um ao outro através dos filhos, isso é triste, ainda mais quando uma criança fica no meio desse fogo cruzado! E por ser um livro tão antigo, fico espantada por ser uma historia bem atual, pena o livro ter ficado meio repetitivo do meio pra frente, mas mesmo assim, acho que a leitura será bem proveitosa. Vou ficar de olho porque quero conferir o filme também! Ótima resenha, bjooo!
Adriana

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