quinta-feira, 28 de maio de 2015

RESENHA: Jane Eyre

“ – Senhor, eu não acho que tenha o direito de comandar o que eu digo somente por ser mais velho do que eu, ou porque tenha visto mais do mundo do que eu. Sua afirmação de superioridade depende do uso que fez do seu tempo e de sua experiência.” (BRONTË, p.242, 2014)

Minha vontade de ler "Jane Eyre" remontava há tanto tempo que quando o livro chegou às minhas mãos, eu nem lembrava sobre o que se tratava ou o que havia me atraído. Gosto quando isso acontece. Quando mergulho em uma leitura sabendo apenas os contornos que irá assumir, mas sem saber para onde ela pretende me levar. Tudo que eu sabia a respeito de "Jane Eyre" era sua importância para a literatura - em especial por se tratar de um texto tão avançado em termos de feminismo nos idos de 1800 – e quando o li, fui surpreendida por uma narrativa vivaz e cativante e por uma das melhores protagonistas da literatura clássica com as quais já me deparei.

Jane Eyre é uma menina órfã que vive com a viúva de seu tio e três primos. Desprezada e frequentemente humilhada, aos dez anos é enviada para uma escola de caridade, pois os parentes querem estar livres dela. O lugar, apesar de rígido, lhe proporciona anos felizes e é seu lar até os 18 anos quando consegue um emprego como preceptora em Thornfield. E é lá que ela se apaixona por Edward Rochester.

Verdade seja dita: nem todo clássico empolga. Mesmo eu que gosto muito desse tipo de literatura, às vezes não me sinto no clima para suas histórias de poucas reviravoltas, suas narrativas mais lentas e seus textos, geralmente, mais rebuscados. Com "Jane Eyre", todos esses conceitos podem ser deixados de lado, já que há anos eu não lia um clássico tão envolvente. A narrativa em primeira pessoa transborda sentimento e ação mesmo nas cenas mais insignificantes e faz um retrato do pensamento da época, abordando temas como diferença de classes e a submissão da mulher.

E tudo começa com sua protagonista. Com uma única cena já é possível entendermos a vida de Jane e nos afeiçoarmos a ela. Dali para frente, o que acompanhamos é sua jornada. Jane Eyre é uma das melhores personagens femininas da literatura. Cheia de personalidade, determinada, alguém que diz o que pensa e se impõe (mesmo quando todos ao seu redor esperam que não o faça) e que luta para fazer da sua vida o que ela acredita merecer por seus próprios méritos. Com tamanha riqueza, não espanta que a personagem não seja apenas a protagonista e sim toda a história.

Mesmo não havendo uma divisão formal, é possível considerar que "Jane Eyre" é composto por três fases: a infância de Jane, sua temporada como preceptora e o que se segue depois que deixa Thornfield.

Como a história se compõe de fases da vida de Jane, ela é a única personagem que acompanhamos do início ao fim. Todos os outros, eventualmente, ficam para trás. Eles não fazem parte da história, existindo apenas para ajudar a moldar o caráter da protagonista, já que as situações que ela vive e a maneira como age diante delas vão aos poucos definindo quem ela é. Essa é uma estratégia arriscada, já que os personagens secundários poderiam soar desimportantes, dando a impressão de estarem ali apenas para ocupar espaço. Mas não é o que acontece. Charlotte Brontë consegue fazer com que o leitor viva cada momento junto com a sua personagem, de forma que cada fase soa como única. Aquela situação e aquelas pessoas são tudo o que existe até que Jane avance para uma nova etapa.

Não são todos os autores que conseguem transitar por tantas fases da vida de um personagem e manter todas igualmente cativantes. Charlotte Brontë só consegue isso graças à riqueza de material que a protagonista proporciona. Para o leitor, é um prazer acompanha-la e torcer para que encontre uma vida melhor e seja feliz. Embora o romance entre Jane e Rochester seja parte fundamental da trama, eu não considero esse o arco principal do livro. Como mencionei antes, "Jane Eyre" é um livro sobre Jane Eyre, sobre quem ela é e todos os seus sentimentos, não sobre seu romance ou sobre seu trabalho ou sobre sua família.

Uma áurea de mistério ainda ronda momentos da história e, para mim, foi impossível não associar Thornfield ao cenário de um dos meus livros favoritos, “O Morro dos Ventos Uivantes”, da autoria da irmã de Charlotte, Emily Brontë.

Mais que uma personagem, Jane Eyre é um símbolo. É uma ruptura dos romances que contavam com protagonistas indefesas, mulheres que eram criadas para almejar o casamento e ter na união o ponto máximo de felicidade de suas vidas e sua razão de sobrevivência. Talvez por isso ela seja tão cativante. Em um cenário tão distante da nossa realidade, ela consegue soar real. "Jane Eyre" fala sobre independência e sobre fazer o que é certo sob os seus próprios padrões. Sua história é tocante e digna de admiração. Em meio a outros simbolismos, a inversão de papéis proposta pela a autora é o desfecho ideal para a jornada da personagem.

Essa edição conta ainda com um prefácio - que contextualiza a publicação e recepção do livro à sua época, assim como faz um breve relato sobre a vida das três irmãs Brontë e de como suas realidades pessoais influenciaram suas obras – e um posfácio cujo tema é a mulher na época vitoriana e o quanto Jane Eyre era diferente delas. Por se tratar de uma edição especial, a diagramação contribuiu para que o livro crescesse um pouco. Apesar deste volume ter quase 800 páginas, "Jane Eyre" não é um livro tão extenso quanto possa parecer.

Em 2006, a BBC fez uma adaptação do romance de Charlotte Brontë que contou com Ruth Wilson como Jane Eyre e Toby Stephens como Edward Rochester. Em quatro episódios de uma hora, a produção conseguiu manter-se fiel ao livro de maneira que poucas vezes acontece. Assisti a microsérie nos dias que se seguiram a minha leitura e gostei muito.

Título: Jane Eyre (exemplar cedido pela editora)
Autora: Charlote Brontë
Nº de páginas: 779
Editora: Martin Claret

20 comentários:

Luiza disse...

Tenho um exemplar aqui em casa mas ainda não li... Vi o filme versão de 2011 e como ADOREI... Ficou com olhos cheios de lágrimas mas amei.
Bjs
eternamente-princesa.blogspot.com.br

Unknown disse...

Oi Mari,
Tenho muita vontade de conhecer a escrita da Charlotte Brontë!! Acredito que Jane Eyre é uma daquelas obras que marcam e todas as resenhas que leio diz o quanto o leitor se "apega" a personagem emocionalmente.
Esse livro já está na minha lista de desejados algum tempinho e sua resenha despertou de novo meu interesse :)
Beijos e parabéns pela ótima resenha,

http://versosenotas.blogspot.com.br/

Unknown disse...

Oi Mari!
É uma vergonha, mas não li quase nada em termos de literatura clássica até hoje... :( Mas agora me interessei! Quem sabe já começo com o pé direito, conhecendo Jane Eyre e sua história magnífica? Deve ser incrível ver uma personagem tão forte e cheia de ideais em um romance desta época, onde as mulheres não tinham voz nem vez... vai para os desejados, com certeza!
Bjus,
Paty Algayer - http://magicacult.blogspot.com.br/

Nadja disse...

OI! Me lembro desse livro vagamente, mas somente da capa, a história já me fugiu a memória. Mas amo histórias de época, também os clássicos. Concordo com você, alguns clássicos podem ser cansativos, já li muitos antigamente e tenho saudades desse estilo de leitura. Acho que esse livro é uma boa indicação para um leitura agradável. Mais do que uma mocinha forte, ela é uma mulher que prega pelos seus direitos, amo personagens femininas cheias de personalidades e que surpreende pela suas ações e pelo que fala. Gostei do livro e tenho vontade de ler O Morro dos Ventos Uivantes da irmã da autora.

Diane disse...

Ainda não li nada de Charlotte , já fui muito bem recomendada sobre os seus livros , mas , a anta aqui ainda não leu nada !
Vou me esforçar para adicioná-lo na minha meta de leitura 2015 ...

http://coisasdediane.blogspot.com.br/

Gabriela CZ disse...

Tenho certo interesse por clássicos mas confesso que não sabia muito sobre Jane Eyre. Concordo que é preciso estar "no clima" para se ler um clássico, mas pelos seus comentários ele não exige muito disso. Fiquei muito interessada pela estrutura do livro e pela protagonista, Mari. Adoro personagens femininas fortes. Certamente irei ler. Ótima resenha.

Abraço!
http://constantesevariaveis.blogspot.com.br/

Jacqueline Braga disse...

Oie Mari
eu fiquei desejando esse livro tanto tempo, e quando comprei (início do ano), acabei esquecendo na estante. Agora vejo o erro que cometi.
Amo O morro dos ventos uivantes, e minha intuição diz que amarei ainda mais Jane Eyre.
Resenha perfeita, como sempre. Vou lá tirar meu exemplar da estante (P.S: comprei a versão econômica, mas fiquei desejando muito essa versão)
bjos
www.mybooklit.com

Guilherme disse...

Oi!
Tenho muita vontade de ler esse livro para conhecer mais o trabalho das irmãs Bronte, tenho O Morro dos Ventos Uivantes aqui mas ainda não li.
Abraço!
Leitura Fora De Série

Paula Juliana disse...

Oi Mari! Já ouvi uma pessoa muito querida falar muito bem sobre essa obra, adorei a sua resenha! Me deu ainda mais vontade de ler, já gosto dos romances de épocas da mocinhas indefesas e quietinhas, imagina então das fortes, a frente do seu tempo como a Jane! Muito curiosa! Parabéns pela resenha! Beijos
http://overdoselite.blogspot.com.br/2015/05/resenha-primeiro-e-unico-emily-giffin.html

Luis Carlos disse...

Eu não costumo ler esses clássicos, porque muitas das vezes as histórias são paradas, e isso acaba me desanimando. Pela resenha, vi que esse livro é diferente, e foi por isso que me conquistou. Não só o enredo me atraiu, mas também a protagonista, por ter bastante personalidade!

Sil disse...

Olá Mari.
Só fiquei sabendo desse livro bem recentemente quando estava procurando clássicos para ler para um desafio que estou participando. E o que sabia do livro era o que você sabia quando começou a ler. Gostei bastante da resenha e vou adicionar o livro na minha lista de futuras compras. A protagonista me pareceu ser daquelas que vale muito a pena ser lida.

Blog Prefácio

Maisanara F. disse...

Oi, também gosto muito de ler um livro sem lembrar direito do que o livro trata, mas sabendo que ele me chamou a atenção. Não gosto muito de romances de épocas, mas até que o livro parece ser bom.A protagonista me chamou a atenção por ter uma personalidade forte e a história por abordar como as mulheres eram oprimidas antigamente. Bjus.

Inês Gabriela A. disse...

Olá,
Também gosto de clássicos, mas quando alternados com uma leitura mais leve ali e outra mais leve aqui, lendo sem compromisso e sem pressa. Alguns realmente possuem linguagem rebuscada, às vezes isso me incomoda, às vezes não. Gostei da resenha.
Beijos.
Memórias de Leitura - memorias-de-leitura.blogspot.com

Gi disse...

Mari,
Eu sou simplesmente muito fã desta obra. O Sr. Rochester não é o típico mocinho, mas ainda assim torcemos para o final feliz. Amei o blog!
Abç,
Boo Nina
http://www.rascunhocomcafe.com/2015/05/desejo-meia-noite-maravilhosa-familia.html

Estante Diagonal disse...

Que coincidência eu voltar para comentar justamente quando tu vem falar de Jane hahaha, estou cada vez mais inclinada a conhecer os livros. Vou me dedicar e me disciplinar, preciso sair mais da minha zona de conforto!

Beijos,
Joi Cardoso
Estante Diagonal

Ana I. J. Mercury disse...

Nooooossa, ameeei sua resenha!!
Já li muitas resenhas sobre este livro, mas a maioria é mais "morna"
Amooooo livros de época, daquelem bem antigões mesmo, principalmente JANE AUSTEN <3
Também amei O Morro dos ventos uivantes, apesar de ser tristinho.
Estou loucaaaa para ler Jane Eyre, mas vou adiando a leitura, por causa das resenhas que li, acredita que muitaaaas falam que a Jane foi apenas uma meninaorfã e tal...?!!
Pois é, achei que fosse triste, por isso ainda não tive coragem de ler!!
Mas pela sua resenha deu para perceber que é um livro superinteligente, já QUERO PARA ONTEM!!
vou ler rapidãoo kkk to curiosa demais!!
bjãoo
Ana

RUDYNALVA disse...

Mari!
Gosto dos escritos da autora e realmente o exemplar analisado foi um avanço enorme para seu tempo. E talvez por isso tenha se tornado um clássico.
Não tive ainda oportunidade de ler e acredito que meu momento do agora não o permita fazer, mas ele está na lista dos livros que quero e desejo para leitura.
“Os homens não desejam aquilo que fazem, mas os objetivos que os levam a fazer aquilo que fazem.”(Platão)
Cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/

Nardonio disse...

Pelo que vi, o talento vem do sangue, né?!?!
Confesso que não sou muito de clássicos, pois, como você disse, alguns deles são bem mornos, sem reviravoltas e narrativa rebuscada. Que bom que esse é diferente. A trama não me parece ser muito elaborada, mas a narrativa deve ter feito a diferença. E essa personagem também. Acho que dá até impressão de que ela é real. Ponto para a autora nesse quesito. Enfim, se tiver oportunidade, vou ler/assistir algum dia.

Seguidor: DomDom Almeida
@_Dom_Dom

Gisela Menicucci Bortoloso disse...

Eu sou apaixonada por este clássico, já li duas vezes e acredito que ao longo do tempo vou lê-lo novamente. Até os filmes da obra eu coleciono. Ótima resenha.
Abraços,
Gisela
@lerparadivertir
Ler para Divertir

Marcela disse...

Hey!
Sou completamente APAIXONADA por esse clássico, é o meu sonho ter um exemplar na minha estante rsrs. Amo tudo nele, a narrativa, a escrita, os personagens, o suspense e o mistério hihi.. Lembro que eu só o li por causa do filme, e que filme lindo...
Adorei sua resenha!
Bjs
livrosemarshmallows.blogspot.com.br

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