segunda-feira, 16 de maio de 2016

RESENHA: O Outro

“Às vezes, ele se perguntava o que era pior: o fato de a pessoa amada ser outra com outro ou exatamente aquela com quem se partilha uma intimidade. Ou então as duas situações eram igualmente ruins? Pelo fato de que, de uma maneira ou de outra, alguma coisa é roubada – algo que nos pertence ou algo que deveria nos pertencer?” (SCHLINK, p. 18, 2009)

Quando “Mentiras de Verão” caiu nas minhas mãos, eu não imaginava que a leitura despretensiosa de um rápido livro de contos se tornaria uma das minhas melhores de 2015. Foi ela que me apresentou a Bernhard Schlink e me deixou querendo ler qualquer outro livro do autor.

Após a lenta e dolorosa morte da esposa, Bengt está tentando reencontrar o rumo de sua vida quando recebe uma carta, endereçada a ela, de alguém que não sabia do falecimento. Alguém com quem ela tivera um romance há anos. Bengt responde à carta, mas O Outro o confunde por Lisa, já que a inicial “B” também se aplica à Bela, o apelido que ele tinha para a amante. Assim, os dois passam a se corresponder até que Bengt não resiste a curiosidade de conhecer o homem com quem sua mulher teve um caso.

Schlink domina a arte de extrair histórias do cotidiano. Pessoas normais e situações corriqueiras viram grandes dramas nas palavras desse autor que sabe expor seus personagens de forma que com poucas linhas já parece que somos velhos conhecidos e que estamos dentro de suas almas. Essa habilidade fez com que eu, que costumo fugir de histórias com triângulos amorosos, fosse atraída pela premissa de “O Outro” devido à ideia de ver uma pessoa que conviveu tantos anos com outra em uma relação de intimidade descobrir que talvez não soubesse tanto sobre ela como pensava. Eu imaginava que Schlink não se ateria às circunstâncias e consequências do caso, mas sim focaria nos milhares de questionamentos que surgem a partir da descoberta: por que essa mulher foi diferente com o amante do que foi com ele? Por que havia coisas que ela conseguia compartilhar com o amante e não com ele? Se havia um outro lado nela que ele desconhecia, até que ponto foi verdadeiro o que viveram juntos? O que eu encontrei foi ligeiramente diferente, mas não me desagradou.

Com capítulos muito breves e uma narrativa direta ao extremo, Schilink não perde tempo com informações que poderiam rotular seus personagens e sim nos expõe aos seus sentimentos. Demoramos até saber qual era o emprego de Bengt, de Lisa, suas idades e até mesmo a saber os seus nomes, mas entendemos imediatamente o que a mulher e a perda dela significam para este homem. O mesmo acontece com o amante, mesmo que ele tão pouco apareça. Isso porque o autor nos joga na rotina dos personagens e, ao invés de perder tempo com contextualizações, nos permite testemunhar esses personagens apenas serem quem são. É até engraçado perceber essa falta de informações concretas e ainda assim sentir que se sabe tudo sobre eles. Em uma determinada cena, um diálogo entre pai e filha, que se estende por apenas uma página, acaba sendo profundamente revelador de toda a dinâmica familiar (muito mais do que capítulos e capítulos de informações seriam) porque Schlink é o tipo de autor que trata de “quems” não de “o quês”.

Por ter poucas páginas e também pela narrativa fluida e direta, li “O Outro” em poucas horas e, em um primeiro momento, estranhei já ter chegado ao fim. Pensei que a história poderia ter sido mais detalhada, mas depois percebi o quão desnecessário isso era. A verdade, é que “O Outro” não é sobre o affair de Lisa, não é sobre o amante, sobre ela, nem mesmo sobre o casamento de Lisa e Bengt. Essas são apenas as janelas que farão Bengt enxergar coisas sobre si mesmo que ele nunca viu antes.

“O Outro” se revela um livro sobre como, algumas vezes, podemos nos acostumar com as coisas, sobre como nos cegamos e esquecemos que existem outros ângulos para serem vistos e outras possibilidades para serem exploradas. Não é uma história sobre encontrar respostas ou resolver pendências. É sobre enxergar o que há para ser visto e aceitar.

Título: O Outro
Autor: Bernhard Schlink
N° de páginas: 95
Editora: Record

22 comentários:

Jeni Viana disse...

Oi, Mari! Tudo bem contigo, moça?

CARAAAAAAAAMBA! Que resenha é essa? Amei! É a primeira que leio desse livro e juro que não dava nada por ele até o momento em que li o primeiro parágrafo representante das suas impressões. Não pude deixar de ficar abismada com a quantidade de páginas que possui para uma história tão densa! Valeu muuuuuito a dica!

Um beijo,
Blog Doce Sabor dos Livros | Página no Facebook | Twitter |
docesabordoslivros.blogspot.com

Unknown disse...

Que resenha linda, Mari! E que trama, hein? Fiquei completamente envolvida só em ler tuas impressões, imagino como será a experiência da leitura.
Já está na wishlist!
Beijinhos,
Alice
www.wonderbooksdaalice.com

Unknown disse...

Oie,
não conhecia, mas achei bem interessante a história.

bjos
http://blog.vanessasueroz.com.br

Luiza Helena Vieira disse...

Oi, Mari!
Jura que esse babado todo cabe em menos de 100 páginas???? Gente, já anotei aqui pra ler porque fiquei bem intrigada com isso. Fora que o número de páginas colaborou
Beijos
Balaio de Babados

Camila Monteiro disse...

Nossa adorei a ideia. Eu que prometi não incluir mais nada na minha lista esse ano, já estou abrindo o skoob aqui hahaha

Adorei essa dica. Tb não conheço nada do escritor. Vou me informar melhor. Valeu.

>> Vida Complicada <<

Thalita Branco disse...

Olá Mari!
Gostei muito de conhecer esse livro, mas fiquei curiosa justamente com aquilo que ele não mostra.
Bjs

EntreLinhas Fantásticas - Participe do nosso SORTEIO do DIA DO ORGULHO NERD

Carolina Garcia disse...

Olá, Mari!

Sua resenha está muito boa, mas o livro não me atraiu muito.

Fico feliz que mesmo não tenha sido o que esperava, acabou sendo uma leitura que te agradou porque é isso que vale no fim, né?!

Bjs!!

livrosontemhojeesempre.blogspot.com.br

Gabriela CZ disse...

Pelo visto o autor tem mesmo de captar algo corriqueiro e transformar numa bela história, Mari. Também costumo correr de triângulos amorosos, essas histórias precisam ter um diferencial muito grande para me encorajar a ler. E pelo visto essa é uma delas. Ótima resenha.

Beijos!

Diane disse...

Oie...
Ainda não conhecia esse livro, mas, fiquei bastante interessada nele... A premissa é muito interessante e também gostei de saber que tem capítulos curtos, pois, livros assim costumam fluir muito bem pra mim.
Beijos

Bruna Lago disse...

Poxa, vou te falar que fiquei triste por ele. Não é fácil descobrir algo assim e ainda continuar a investigar e tudo mais.
Mas também as coisas acontecem assim na vida ne.. Descobrimos que não sabemos muitas coisas daqueles que estão ao nosso redor. Enfim, gostei muito do livro, por maos que seja curto, imagino que seja bem intenso.

FernandaK disse...

Oi, Mari, vim conhecer o seu blog!
Amei esse post, não conhecia o livro, mas certamente me cativou. A história em si é interessante, mas a forma como vc colocou sobre a visão do autor parece fascinante... Uma história dessas parece ser só de um triângulo amoroso clichê, mas essa análise me fez querer ler e descobrir, afinal, sobre esses personagens tão comuns e tão únicos!

Queria aproveitar para te convidar a conhecer o meu blog de resenhas, Spazio di Libri. Já estou te seguindo também! Se puder me dar uma força me seguindo, curtindo a página e comentando, eu iria adorar!

Um beijo,
Fernanda
http://spaziodilibri.blogspot.com.br/

DESBRAVADORES DE LIVROS disse...

Olá, Mari.
Pelo visto, o autor possui uma estrutura narrativa bem diferenciada, o que me chama bastante a atenção. Quero ver como se comporta essa escrita que não é "contextualizada", mas que ainda assim é reveladora em relação aos protagonistas. Quero desbravar esse enredo, esse drama.
Ótima resenha. Dica anotadíssima.

Desbravador de Mundos - Participe do top comentarista de maio. Serão três vencedores!

Vanessa Vieira disse...

Gostei da resenha Mari. Parece ser um livro bem instigante e se tiver oportunidade, pretendo lê-lo. Beijo!

www.newsnessa.com

Bia Gonçalves disse...

Oi Mari! Caramba, não conhecia o autor tão pouco a obra e já estou mega interessada. Pela forma que escreveu a respeito da obra, fiquei curiosa por perceber que se trata de um modo diferente de escrita.
Para a lista de desejos.
Beijos
http://lua-literaria.blogspot.com.br/

Lilian Huzyk disse...

Que máximo! Nunca havia ouvido falar de histórias desse tipo, então fiquei realmente interessada em saber o desfecho dessa troca de informações entre marido amante, muito legal! Adorei sua resenha!

http://www.leitorasvorazes.com.br/

Sil disse...

Olá, Mari.
Não conhecia o autor ainda e o livro me interessou bastante. Ele é bem curtinho mesmo, até parece um conto hehe. Nossa que situação essa. Nem sei como eu reagiria se fosse comigo. As vezes convivemos anos com alguém e não conhecemos essa pessoa de verdade. Gostei bastante do autor mostrar isso de ver o que nós não enxergamos ou queremos enxergar.

Blog Prefácio

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Oi Mari! Essas histórias que falam do cotidiano me agradam bastante! Esse livro parece ser muito bom!

Jéssica Patrício - pitadadecinemaeleitura.blogspot.com.br

Thuanne Souza disse...

Gostei da premissa, deve ser um livro bem bacana, bem reflexivo.
Vai pra minha lista de leituras.

Unknown disse...

Oi!
Ainda não li nada do Bernhard Schlink, mas por esse ser um livro pequeno fiquei curiosa para conhecer sua escrita, achei bem interessante o autor tirar as historia de situações cotidianas, nos deixando curiosos e envolvidos e quero ver se pego esse livro para ler !!

Ana I. J. Mercury disse...

Não conhecia o livro, e confesso que quando tem traição no meio, nem pego pra ler, rsrs
Mas gostei muito da sua resenha, mostrou como o livro é interessante sob vários aspectos.
Anotado aqui, se tiver oportunidade, lerei pelo menos pra conhecer o autor.
bjss

Unknown disse...

Um livro curto com uma grande estória, o falecimento da mulher, a troca de cartas, os desdobramentos que ocorrem disso e o fato de aos poucos serem revelados detalhes importantes dos personagens chamam a atenção para esse enredo, eu raramente leio livros com essa temática, mas esse me deixou curioso e pensando em abrir uma exceção.

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