quinta-feira, 16 de março de 2017

RESENHA: Os Miseráveis

Os Miseráveis Victor Hugo
Jean Valjean foi condenado a trabalho forçado nas galés e, por causa de inúmeras tentativas de fuga, teve que cumprir uma sentença de dezenove anos. Quando é liberto, percebe que a condição de ex-prisioneiro nunca o abandonará, motivo pelo qual troca de nome e recomeça sua vida.  É então que conhece Fantine, uma mulher que teve uma vida difícil, tendo até mesmo que abandonar sua filha, Cosette. Mas antes que Jean possa ajudá-las, o inspetor Javert se coloca no encalço do antigo forçado, determinado a levá-lo a justiça. Anos depois, a vida destes personagens irá se cruzar com o jovem Marius, um estudante engajado com a Revolução de 1832. 

A primeira observação que faço é que está sinopse é sucinta, pois se trata de uma tarefa hercúlea, senão impossível, resumir em poucas palavras a trama magistral de Os Miseráveis. Entretanto, creio que a tentativa de explicar com mais detalhes a premissa da trama acarretaria em spoilers, motivo pelo qual optei por prezar pela concisão. 

O primeiro fator que chama atenção é como a narrativa de Victor Hugo é fluida e envolvente, não dando a menor impressão de ser um livro publicado há mais de cento e cinquenta anos. Assim, mesmo que o início do livro demore cerca de cem páginas para realmente engrenar, o leitor não sente essas páginas pesarem (ainda mais por que apresentam um personagem coadjuvante interessantíssimo).

“O que é essa história de Fantine? É a sociedade comprando uma escrava. De quem? Da miséria.Da fome, do frio, do isolamento, do abandono, da privação. Dolorosa negociação. Um alma por um pedaço de pão. A miséria oferece, a sociedade aceita. [...]. Dizem que a escravidão desapareceu da civilização europeia: é um erro. Existe ainda, mas não pesa senão sobre a mulher, e chama-se prostituição.” (HUGO, 2014, p. 229)

Mas quando Hugo começa a desenvolver o cerne da estória, prepare-se para embarcar em uma aventura emocionante. O autor faz retratos da miséria sem poupar o leitor, mostrando como os mais diversos personagens perdem, pouco a pouco, sua humanidade. A partir do momento em que se é ignorado socialmente e que as necessidades mais básicas não são saciadas, o ser humano regride aos seus impulsos mais animalescos. E quem pode culpá-lo? É com uma narrativa sutil e tocante que Hugo compõe um quadro doloroso, sendo impossível não sentir um aperto no coração vendo dramas tão intensos e injustos. 

O ponto alto do livro certamente é a crítica social contundente que Victor Hugo desenvolve ao longo da estória, expondo diversas feridas de nossa sociedade como a pobreza, a criminalidade, a injustiça, o abuso infantil, a prostituição e a forma como tratamos pessoas menos favorecidas. Apesar do autor não dar nenhuma lição de moral, a estória é tão forte e impactante que equivale a uma sucessão de “tapas na cara”. Assim, ao mesmo tempo em que emociona, Os Miseráveis também causa desconforto, por revelar uma realidade amarga para a qual fechamos os olhos. 

A construção dos personagens também merece destaque. É impressionante como o autor consegue criar personagens tão reais e vívidos, de modo que o leitor entende suas motivações e ações. É preciso elogiar, principalmente, a composição de dois personagens: Jean Valjean e Javert. A caracterização de protagonista e antagonista é impecável, pois vai muito além de uma visão maniqueísta. Assim, Jean não é um santo, mas Javert também não é um demônio. São homens, com qualidade e defeitos, e que tentam fazer apenas o que julgam ser correto.

“De sofrimento em sofrimento, chegou, pouco a pouco, à convicção de que a vida é uma guerra; guerra em que o vencido era ele. A única arma que possuía era seu ódio. Resolveu afiá-la na prisão e levá-la consigo quando fosse embora.” (HUGO, 2014, p. 129)

Entretanto, preciso apontar dois fatores que me desagradaram na leitura de Os Miseráveis. O primeiro diz respeito às incontáveis e extensas divagações do autor sobre os mais diversos assuntos, como a Batalha de Waterloo, a vida monástica e, pasmem, até mesmo o sistema de esgoto parisiense. Considerando o tamanho do livro, tais divagações, embora até fossem interessantes, me pareceram desnecessárias, sendo que pouco contribuíram para o desenvolvimento da estória. 

Outro fator que não me agradou foram as estórias do núcleo composto por Marius, seus amigos e sua família, bem como o desenvolvimento da Revolução Estudantil de 1832. Curiosamente, este trecho é apontado por muitos leitores como o ápice da estória, mas não posso afirmar o mesmo. A meu ver, é nesta parte da estória que Victor Hugo pesou a mão e não conseguiu dar a mesma densidade aos personagens, tampouco aos seus dramas. Assim, admito que não me importava com este núcleo, tampouco com o pano de fundo histórico, restando-me apenas aguardar o desenvolvimento deste arco narrativo até que os demais personagens retornassem à cena. 

Rompendo as barreiras de diversos gêneros literários, Os Miseráveis certamente foi uma das melhores leituras da minha vida, seja pela força dos personagens e seus dramas, seja pelas reflexões que proporciona, seja pelo impacto que a estória causa. Um clássico que permanece atual e que emociona com suas estórias de dor, amor, amizade e redenção.  

Título: Os Miseráveis 
Autor: Victor Hugo
N.º de páginas: 1509
Editora: Martin Claret
Exemplar cedido pela editora

Compre: Amazon
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17 comentários:

Luiza Helena Vieira disse...

Oi, Alê!
Cara, eu li uma versão super compacta dessa história quando criança e amei! Hoje em dia, não sei se leria, justamente por causa dessas divagações.
Beijos
Balaio de Babados
Sorteio Literário de Carnaval
Sorteio Três Anos de Historiar

Unknown disse...

O livro mostra a historia verdadeira de como o ser humano é capaz de de tudo, maldades, escravidão, prostituição entre outros tantos reunidos em um livro, não tenta esconder hora nenhuma sobre o passado dos personagens gosto disso.
Até mais!!!

Gabriela CZ disse...

Tenho Os Miseráveis em minha lista pela sensação de ser uma daquelas obras que todo mundo deve ler em algum momento da vida, e você confirmou isso, Alê. Certo que é uma característica bastante comum dos clássicos, mas nesse caso me parece ter algo mais sobre o sentido de humanidade além, é claro, de uma ótima trama. Preciso ler. Ótima resenha.

Beijos!

Anônimo disse...

Oi, Alê!

Os Miseráveis é uma leitura maravilhosa e envolvente, além de abordar temas que merecem ser discutidos - até hoje. Concordo contigo, em alguns momentos, a narrativa é um pouco maçante, mas a história em geral é ótima, assim como os personagens.

Beijocas.
http://artesaliteraria.blogspot.com.br

Nessa disse...

Oi Alê
Vi esta edição na livraria e me apavorei com o tamanho. Tenho muita vontade de ler e conhecer a história.

Beijinhos
http://diariodeincentivoaleitura.blogspot.com.br/

Carolina Garcia disse...

Oi, Alê!!

Comentei com vocês no instagram que minha meta é terminar em algum momento esse livro. Hahahaha
Não tenho essa edição linda, mas uma que é dividida em dois tomos e só tenho o primeiro aqui em casa.

Mas confesso que acabei postergando a leitura desse livro porque minha lista de títulos obrigatórios já está passando da conta! Hahahaha

Preciso de dias maiores para conseguir encaixar esse livro. xD

Mas gostei muito da resenha. Acredito que vou concordar com você nos aspectos desnecessários da obra. E com certeza imagino todos os tapas na cara que viram ainda.

Bjs!!

http://livrosontemhojeesempre.blogspot.com.br

RUDYNALVA disse...

ALê!
Tem uns 30 anos que li esse livro e parece tão atual que, conforme fui lendo sua resenha, fui lembrando do quanto fiquei melancólica durante a leitura, porque a situação era bem crítica e agradecia a todo instante por ter uma vida boa, sem ter que passar por tantas privações.
Não é atoa que é um clássico, porque as problemáticas apresentadas por Hugo são tão atuais que parecem novas...
“Não confunda jamais conhecimento com sabedoria. Um o ajuda a ganhar a vida; o outro a construir uma vida.” (Sandra Carey)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
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Tony Lucas disse...

Oi, Alê! Tudo bem? Há uns quatro ou cinco (não me lembro) anos eu vi uma adaptação de Os Miseráveis (aquela que concorreu ao Oscar) e me lembro que fiquei muito chocado com a dura realidade apresentada na obra. A história que mais me chocou e emocionou foi a da Fantine, que foi brilhantemente interpretada pela Anne Hathaway.

Abraço

http://tonylucasblog.blogspot.com.br/

Na Nossa Estante disse...

Oi Alê, tudo bem?

Os miseráveis está na minha lista de clássicos que preciso ler antes de morrer! Entendendo que nem todos os personagens e suas histórias nos agrade, acho normal, principalmente numa obra tão rica como esta. Ainda vou ler, antes de morrer, assim espero kkkkkkkkk

Bjs, Mi

O que tem na nossa estante

Girlene Viey disse...

Adoro historia que remente a esse mundo de prostituição, e um assunto muito forte. Mas muitas pessoas não entende que muitas vezes as pessoas não estão ali porque querem.
Fantine me pareceu uma mulher bastante forte apesar de tudo que esta passando e passou. Imaginei o quanto deve te sido triste ela abandonar a filha. Enfim, adorei o livro, justamente por trazer uma critica social que é tão importante esta na mesa

Giulianna Santicioli disse...

Preciso muito ler esse livro, é um dos mais conhecidos clássicos e deve ser ótimo para conhecermos essa realidade que muitos de nós não queremos enxergar, para conseguir ler só preciso criar coragem mesmo, porque não parece ser um daqueles livros que em 3 dias vocês já finaliza.
Beijos!

Kemmy disse...

Não sabia que esse livro era assim tão antigo :O ganhei uma edição dele, mas como era em Inglês e não sou assim tããão fluente, acabei trocando. Agora tenho apenas um (tomo?) em Francês que guardo porque estou aprendendo francês e, afinal, o que é um (tomo?) perto de um livro de 1500 páginas? hahaha
Sinceramente não sabia direito do que se tratava o livro, mas adorei saber! Me fez lembrar um pouco de Vidas secas - não li o livro, mas acabei de ler uma resenha dele. Uma pena essas divagações aleatórias e desnecessárias do personagem, né? Talvez fosse melhor ter diminuído algumas páginas... mas ainda bem que mesmo assim foi uma das melhores leituras da sua vida!
Fiquei bem curiosa, embora eu saiba que vou demorar pra encarar um livro desses.

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Priscila Tavares disse...

Oi Alê, tudo bem?
Olha, de amiga para amiga, eu sei que esse livro é um clássico e tals, mas até esse exato momento não tinha vontade de ler a obra. Fiquei curiosa para saber como o autor descreve as condições dos personagens sem poupar o leitor. Vou ver se consigo adquirir o livro o quanto antes.
Beijos
Quanto Mais Livros Melhor

Marta Izabel disse...

Oi, Alê!!
Sempre tive vondade de ler esse livro de Victor Hugo. Mas nunca tive oportunidade. Essa edição está linda e só fiquei um pouco assustada com o tamanho do livro.
Bjoss

Jonatas Amaral disse...

Olá,

Estou para ler "Os miseráveis" há muito tempo. Um dia essa leitura sai.
Algo que me surpreendeu na sua resenha foram os coméntários sobre o núcleo da revolução estudantil, já que de fato este é considerado um dos pontos mais marcantes da história, principalmente no que tange a importância histórica da obra.
Gosto de pensar que em muitos momentos as divagações são como pequenas transições para que o leitor tenha base para fazer uma terminada comparação. Vamos ver quando eu ler o livro.
Você me deixou com mais vontade ler o livro.

Jônatas Amaral
alma-critica.blogspot.com.br

Unknown disse...

Oi!
Faz um tempo que li uma versão de Os Miseráveis que me conquistou muito, mas lendo a resenha fiquei novamente com vontade de ler Os Miseráveis, mas uma obra mais completa, esse é um dos primeiros clássicos que me conquistaram e com certeza esse é um livro que mesmo passado tanto tempo ainda consegue ser atual !!

Ana I. J. Mercury disse...

Que linda resenha!
Ai, eu to looooouca para ler Os Miseráveis.
Li, há 5 anos, aquela edição infantojuvenil e adorei, agora, baixei no kindle a edição original, quero ler o mais breve possível, parece ser lindo, reflexivo e até angustiante.
bjs

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