terça-feira, 24 de julho de 2018

RESENHA: A Primeira Pessoa

A Primeira Pessoa / Ali Smith
Há um tempo escrevi um texto aqui no blog chamado “Em defesa dos contos”, no qual falei um pouco sobre como contos deveriam ser mais valorizados pelos leitores. Contos de verdade. Não histórias curtas que ganham o apelido "contos" porque carregam poucos eventos e poucos personagens. Porque não se estendem por um grande número de páginas. Contos “de verdade” são textos breves que se fazem de entrelinhas, onde revelam muito mais sobre aqueles personagens do que os eventos retratados o fazem. Não é à toa que nem todos os autores se arriscam a escrever contos e que alguns se revelam ainda melhores nessa arte do que nas narrativas longas. Tendo dito isso, adoro quando descubro um autor que sabe escrever bons contos e Ali Smith, sem dúvida, é uma delas.

“A Primeira Pessoa” é uma compilação de 12 contos. Todos se valem de uma linguagem direta que apresenta para o leitor os fatos pelos olhos do narrador da vez. A cada conto, novos personagens, novas situações.

Quando solicitei o livro para a editora, o que eu queria era algo que permitisse ser lido aos poucos. Que um intervalo de dias sem dar continuidade à leitura não prejudicasse o meu envolvimento. A escolha foi perfeita, afinal, contos “de verdade” devem ser lidos com tempo para serem degustados (e, por que não, seguidos de uma segunda leitura?).

“Ah, eu tenho bastante de nada. E nada já me basta.” (SMITH, 2012, p. 62)

Em “A Criança”, uma mulher encontra um bebê em seu carrinho de compras no supermercado. Ela tenta devolvê-lo aos pais, mas ninguém se manifesta. Tenta avisar no balcão do estabelecimento, mas ninguém acredita que o filho não é seu, afinal, eles tem até certa semelhança e a criança abre os bracinhos para ela a chamando de “mamãe”. Sensacional.

Um casal tendo um caso extraconjugal é o protagonista de “Fidélio e Bass”, um dos meus favoritos do livro. Outro conto que demonstra toda a habilidade da autora é “A Terceira Pessoa”, sem protagonista, nem tema, sendo um pouquinho sobre cada uma das pessoas que vivem o aquele momento em que um casal tem sua primeira transa.

“Sem Saída” é outro dos meus favoritos. Uma mulher está em uma sala de cinema e vê outra mulher sair por uma porta que, ela sabe, não tem saída, tranca pelo lado de fora e dá para um lugar onde o sinal do celular não pega. Não há nenhuma sinalização ou alerta sobre isso, então provavelmente a tal mulher foi pega de surpresa. Nossa narradora, que testemunha a cena, acredita que alguém irá encontrar a mulher ao final da sessão por isso não fala nada a ninguém. Mas e se não a encontrarem?

Em “Astúcia impetuosidade luxúria”, um casal recebe uma correspondência endereçada a eles, mas sem seus nomes no pacote. O conteúdo lhes causa estranheza e, mesmo tentando, eles não conseguem devolver ou se livrar do pacote. O típico conto que usa de uma situação inusitada e pequena para dominar seus personagens. Por fim, “A Primeira Pessoa” traz uma casal com certa diferença de idade apenas sendo felizes juntos.

Nessa coletânea, os personagens não têm nomes, não têm contexto. Nem precisam. Eles têm personalidades e uma situação em que é interessante vê-los. São breves cenas que nos revelam quem eles são ou nos deixam mais curiosos sobre quem eles são. Contos como contos devem ser.

Título: A Primeira Pessoa
Autora: Ali Smith
N° de páginas: 148
Editora: Companhia das Letras
Exemplar cedido pela editora


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14 comentários:

Teca Machado disse...

Oi, Mari!
Eu não gostava muito de contos, aprendi a gostar. Mas confesso que ainda prefiro histórias mais longas.
Gostei da premissa dos que você citou e fiquei curiosa, principalmente com o bebê no carrinho, do cinema e do pacote.
Imagino que seja um livro para te fazer pensar!

Beijooos

www.casosacasoselivros.com

Vitória Pantielly disse...

Mari,
Sabe porque não sou fã de contos? Muitas vezes sinto que eles são inacabados, como você disse, são apenas histórias curtas e os autores não conseguem dar um começo, meio e fim para aquilo. Que bom que sempre existe algo para nos surpreender não é?!
As propostas são mais do que interessante, são "curiosas", nos instiga a querer ler, e olha, se a maioria dos contos entrou para seus favoritos, não há dúvidas de que são bons.
Como eu já disse, por mais que tenha ressalvas na forma como são escritos, eu gostei de seus comentários, e despertou um interesse que há tempos não sentia em mim.
Beijos

Gabriela CZ disse...

Que interessante, Mari. Os contos me pareceram bem curiosos e perspicazes. Ótima resenha.

Beijos!

Ivy Montiel disse...

Oiii Mari

Eu confesso que leio poucos contos, deveria ler mais porque há verdadeiros achados que envolvem bastante o leitor, mas sempre fica complicado adquirir o hábito. Os contos parecem ser bem interessantes, não conhecia ainda esta coletânea.

Beijos

www.derepentenoultimolivro.com

Lex Macêdo disse...

Oi Mari! Eu não tenho muito hábito de ler contos, mas achei bem interessante a ideia do livro para poder conhecer mais do gênero. Eu amo escrever e tenho muita vontade em me aventurar por gêneros diferentes, seria uma boa conhecer mais sobre contos. Além disso, os enredos parecem ser bem interessantes, achei super curioso esse primeiro do bebê :) Os Delírios Literários de Lex

Evandro Atraentemente disse...

Eu gosto de contos. As premissas são bastante interessantes e diferentes. Realmente os contos têm características bem pessoais e alguns autores parecem ter o dom de escrevê-los. Essa forma de leitura rápida e, ao mesmo tempo, tão intensa e completa é mesmo fascinante. Fiquei curioso com o livro.
Evandro

Nicole Longhi disse...

São poucos os contos que li e me ganharam por serem "contos de verdade".
Creio que se o autor não acerta no conto acaba não captando o leitor.
Não conhecia este, mas gostei bastante da forma como pareceu ser retrato através da sua resenha.
Já adicionei na minha lista.

beijinhos
She is a Bookaholic

RUDYNALVA disse...

Mari!
Sou uma admiradora de contos, os bem escritos, com significado e que podemos captar a essência do enredo.
Parece que esse livro é no estilo e fiquei curiosa em porder ler.
Mesmo que não haja nome nos protagonista, o que importa é o canteúdo e a mensagem.
Bom final de semana!
“O prazer dos grandes homens consiste em poder tornar os outros felizes..” (Blaise Pascal)
cheirinhos
Rudy
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Luiza Helena Vieira disse...

Oi, Mari!
Apesar de ler poucos, eu amo contos e fiquei super interessada nessa coletânea.
Beijos
Balaio de Babados

Na Nossa Estante disse...

UAU Mari!! Adorei os temas dos contos, esse Sem Saída parece genial, já fiquei um tanto agoniada só lendo sua descrição!! Acho que iria curtir a leitura!

Bjs, Mi

O que tem na nossa estante

Nana Barcellos disse...

Oi Mari,
Achei a ideia da coletânea bem bacana e o estilo dos contos também. Não gosto muito desses contos com menos de dez páginas haha. Gosto de contos grandes, por isso adoro os do King.
Esse Sem Saída, me deixou com medinho...apesar de nem parecer de terror. HAHA

até mais,
Nana - Canto Cultzíneo

Ana I. J. Mercury disse...

Mari, também adoro contos bem elaborados.
Eu não conhecia essa livro e agora já quero!
Parece ser muito bom. Sensível, profundo e forte.
Com uma boa narrativa e bom desenvolvimento.
bjs

Luana Martins disse...

Oi, Mari
Leio de tudo, mas confesso que contos leio raramente.
Não tinha conhecimento sobre esse livro e fiquei muito curiosa para ler os contos parecem muito intrigantes e como você disse tem que ser degustados devagar.
Beijos

Ycaro Santana disse...

É um livro bem bonito. Cheio de sutilezas, de uma doçura inesperada, esse conto é um retrato do amor do presente, do viver aqui e agora. Penso que fala de tentativas honestas de construir relações humanas possíveis de afeto, de amor, com os outros e consigo mesma. Qualquer pessoa é capaz de se reconhecer em alguma das passagens.

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