Conversa de Contracapa é coluna off topic do blog Além da Contracapa. Sem limitação temática, iremos explorar todo e qualquer assunto relacionado ao mundo da literatura.
Já reparou que se você pesquisa determinado produto na internet você começa a ver inúmeras propagandas dele enquanto navega em outros sites? Isto acontece por causa dos algoritmos que são usados em mecanismos de buscas e redes sociais, os quais foram projetados com fins comerciais para fornecer ao usuário resultados mais próximos possíveis de suas expectativas.
Posteriormente, os filtros passaram a personalizar toda a nossa experiência online. No entanto, especialistas descobriram um preocupante efeito colateral destes algoritmos: as “filter bubbles” (filtros-bolhas em português). A expressão é utilizada para descrever as bolhas que são causadas por estes algoritmos, as quais mantém os usuários em suas zonas de conforto. Nas palavras de Eli Parisier, “a internet nos mostra o que ela acha que queremos ver, mas não necessariamente o que nós precisávamos ver”.
Dessa forma, estamos presos em bolhas e não temos o poder de decidir o que nos é mostrado. Os algoritmos utilizam diversos critérios para definir o que seria mais relevante para o usuário, nos deixando cegos para todo o resto. E o problema é que as redes sociais são os portões da informação. Segundo os dados constantes no estudo “Information Manipulation: a challenge for our democracies”, mais de 70% do tráfego da internet diz respeito ao uso do Google e Facebook. Além disso, as redes sociais são usadas como fontes de informação por 62% dos americanos e 48% dos europeus. E creio que a realidade brasileira não deve ser diferente.
Desta forma, os algoritmos estão criando casulos, pois “somos expostos apenas aos conteúdos que confirmam nossas crenças” (Romain Badouard, tradução livre). Assim, nunca somos confrontados com outras opiniões e usamos as informações que coletamos nas redes sociais como uma fonte de validação da nossa visão de mundo. Ou pior, como uma validação dos nossos preconceitos.
No Brasil, vivemos em um cenário de extrema polarização. E esta situação é ainda mais acentuada pela atuação dos algoritmos, que nos isolam com aqueles que pensam como nós. E se todas as pessoas dentro da bolha pensam igual, morrem o senso crítico, o diálogo e o debate. Assim, não precisamos mais de argumentos para defender nossas ideais pois não há mais necessidade de argumentar.
E é por isso que a literatura se torna ainda mais vital nos dias de hoje. Precisamos sair da bolha e ser confrontados com novas perspectivas, as quais nos obriguem a refletir sobre nossas convicções. Harry Potter me mostrou que o preconceito existe em muitas formas e que nenhuma delas é aceitável; Os Miseráveis me fez perceber que a meritocracia é uma farsa se as pessoas não partirem das mesmas condições; Capitães da Areia revelou a triste realidade dos garotos de rua e como eles recorrem ao crime por não terem outras alternativas; Ainda Estou Aqui me levou para 1964 e me fez sentir na pele os horrores da ditadura militar.
Creio que enquanto não nos tornarmos um país de leitores, com uma mente analítica e humildade para reconhecer os erros, continuaremos presos em bolhas. Pessoas limitadas às suas opiniões, usando as informações como uma ferramenta de confirmação, orgulhosos demais para admitir que existe um universo inteiro fora da bolha. E se Bilbo Bolseiro me ensinou alguma coisa foi que a aventura só começa quando deixamos a zona de conforto para trás.
Para saber mais:
- Palestra de Eli Parisier no TED: "Tenha cuidado com os filtros-bolhas"
- Relatório "Information Manipulation: a challenge for our democracies” (pdf em inglês).
- Palestra de Eli Parisier no TED: "Tenha cuidado com os filtros-bolhas"
- Relatório "Information Manipulation: a challenge for our democracies” (pdf em inglês).
8 comentários:
Eu tinha parado pra pensar nisso um tempo atrás e chegou a me incomodar muito, até mesmo uma coisa pequena como a opção "explorar" do instagram que, dependendo do que você acessar, ele só passa a te mostrar publicações daquele assunto, vira um ciclo vicioso. Além de achar que nesse parâmetro do consumo é ainda pior, você faz uma única busca de um produto e depois não tem mais sossego, ele vai ser esfregado na sua cara independente do site que você acessar, já vi gente adquirir um produto supérfluo simplesmente porque ele foi “mostrado” pra ele ali, em uma oferta aparentemente “vantajosa”, a pessoa nem mesmo tinha a necessidade de comprar aquilo, só o fez porque estava ali, de fácil acesso. De fato, a leitura nos salva nos dias de hoje, mas acho que até mesmo ela deve ser tratada com cuidado, é sempre bom ficarmos de olho se não estamos presos em certos padrões e temas de livros (algumas vezes até deletérios na formação das nossas opiniões e ideias), é sempre bom buscar e diversificar.
Engraçado que vivemos num mundo de diferentes. Estes dias, uma "colega" me ligou para a ensinar baixo um episódio de uma série na internet.
Eu parei, pensei e mandei: Leia tutoriais!
Pronto, tomei com o telefone na cara.
Um tempo depois, ela me ligou de novo e perguntou o eram tutoriais. rs
Preguiça de ler, de procurar o assunto, de ir anotando e tirando dúvidas.
Eu sou "fuçona", vou atrás de tudo, mas realmente há pessoas que vivem em suas bolhas, que criaram um mecanismo de preguiça, comodismo, difícil de ser quebrado.
Por isso, ler é tão importante, tão essencial para que nós, humanos, quebremos os tabus e nos joguemos no mundo das descobertas!!!
Beijo
Que post mais sensacional! 👏👏👏
Estou até sem palavras; é muito mais do que um filtro de rede social, é algo pra vida.
Sair da bolha é difícil, mas necessário.
Beijos
Alê!
E viva Bilbo Bolseiro que nos tirou da zona de conforto.
Bem difícil esse mundo virtual, não é mesmo?
Acredito que não apenas nas redes sociais, soframaos com essas bolhas, no cotidiano também. Nossa mente é 'programada' para soluções mais fáceis e acabamos sendo conduzidos por ela, acabamos nos tornando 'preguiçosos' mentais, por vezes nem conseguimos criar uma conclusão, um raciocínio lógico, um pensamento coerente... triste...
cheirinhos
Rudy
Oi, Alê
Faz uns meses que pensei muito nesses filtros e realmente eles nos fazem ficar dentro de bolhas.
Mas antes ficava muito em rede social, agora entro publico algo ou participo de alguns sorteios e saio.
Só os livros podem nos tirar dessa bolha e nos ensinar muitas coisas.
Beijos
Não tinha lido nada sobre o lado negativo dos algorítimos mas já tinha pensado a respeito, Alê. Tenho até evitado olhar os anúncios nas redes sociais pois tem me levado a comprar coisas de que não preciso. Mas essa questão de deixar as pessoas em bolhas é muito mais grave que um consumismo exacerbado, pois alimenta a intolerância. Costumo pesquisar sobre artigos duvidosos, evito compartilhar algo sem verificar e recomendo aos conhecidos que façam o mesmo. Infelizmente nem todos me ouvem, e são justo os que não leem que fazem isso. É, a luta contra a desinformação será longa. Excelente post.
Beijos!
Oi, Alê!
Eu fujo desses filtros usando a janela anônima hahhahahhahaha É um truque que aprendi na vida.
Mas realmente.. hoje em dia está bem difícil saber o que nos é apresentado na internet.
Beijos
Balaio de Babados
Olá, Alê.
Excelente seu texto. Realmente tentam controlar tudo o que a gente faz on line. Já cansou de acontecer isso comigo de eu procurar um produto e todo lugar que entro vejo ele lá. E sempre aparece as publicações das mesmas pessoas tanto no face como no IG. Graças a Deus que exitem os livros, mas e quem não lê?
Prefácio
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