Uma das aulas mais intrigantes que tive na pós-graduação de Relações Internacionais foi sobre o Oriente Médio, uma região com uma história riquíssima, marcada por conflitos e que é constantemente mal interpretada. Fascinado pela região, comecei a procurar livros que retratassem essa realidade que é tão desconhecida por mim e foi assim que esbarrei em Passagem para o ocidente, eleito por Barack Obama como “um dos melhores livros do ano”.
Saeed e Nadia são dois jovens que vivem em um país muçulmano e que se conhecem em um curso noturno. Atraídos um pelo outro, acabam dando início a um relacionamento em meio a um ambiente de crescente violência. Quando a guerra civil eclode, eles ouvem rumores sobre portais que levariam para outros países. Desesperados, eles decidem se aventurar por um desses portais, sem imaginar o que os espera do outro lado.
Saeed e Nadia são o cerne absoluto da estória. Não apenas acompanhamos a evolução de seu relacionamento, mas principalmente seu desenvolvimento como pessoas em cenários extremamente adversos. Chama atenção que o autor, inclusive, não dá nomes a mais nenhum outro personagem, ficando clara sua intenção de focar a atenção do leitor no casal de protagonistas.
Passagem para o ocidente dialoga com temas relevantes e atuais, como a crise dos refugiados. Por um lado vemos a dificuldade em abandonar sua nação, que é uma parte importante da nossa identidade, bem como de se reintegrar em um novo local, que muitas vezes é avesso a estrangeiros. Outra discussão muito interessante é a questão dos portais que levam para os mais diversos cantos do mundo e como eles, de certa forma, redefinem o conceito de fronteiras.
“Pode parecer estranho que em cidades cambaleado à beira do abismo jovens ainda compareçam às aulas [...], mas é assim que as coisas são, seja quanto às cidades, seja quanto à vida, pois por um momento estamo entretidos com nossos afazeres habituais e no momento seguinte estamos morrendo, e nosso fim para sempre iminente não interrompe nossos começos e meios transitórios até o instante que o fim chega de fato.” (HAMID, 2018, p. 7-8)
Entretanto, apesar da originalidade e da criatividade da estória, preciso confessar que não gostei da narrativa de Hamid. A meu ver, a regra número um da literatura é o famoso “show, don’t tell”, ou seja, não me diga o que os personagens estão fazendo, me mostre eles fazendo. Infelizmente, Hamid optou por narrar os eventos que acontecem com os protagonistas, bem como seus pensamentos e sentimentos. Essa opção do autor, além de tornar a leitura cansativa, acarretou em um distanciamento do leitor com os personagens, que pareciam estéreis e sem vida.
Outro aspecto que não gostei — e que está diretamente conectado com o anterior — é o excesso descritivo. Creio que uma descrição mais sucinta e precisa é suficiente para transmitir uma imagem ao leitor, enquanto que o exagero apenas tende a interromper sua conexão com a estória. Afinal, a quantidade de estímulos visuais parece colocar o desenvolvimento da trama em segundo plano.
Por fim, também achei o desenvolvimento trama um tanto simples e sem gosto, apesar de ter muito potencial. No fim das contas, fiquei com a impressão de que a Hassin tinha mais interesse em fazer o leitor refletir sobre os assuntos que a obra aborda, do que em desenvolver a trama com mais profundidade, o que iria levar a reflexões de forma mais natural.
Encerrei a leitura com a sensação de que Hassin tinha em mãos uma ótima premissa, mas que pecou na execução. Assim, preciso dizer que achei a declaração de Barack Obama um tanto exagerada.
Autor: Mohsin Hamid
N.º de páginas: 168
Editora: Companhia das Letras
Exemplar cedido pela editora
8 comentários:
Que pena que um enredo tão original não tenha sido bem aproveitado! Falar do Oriente Médio é sempre complicado e complexo,mas dosando isso a personagens bem construídos,com certeza, teríamos algo mais gostoso.
Tá, o romance é bom e tudo mais,mas...não somente isso!!!
Como não conhecia o livro e é aparentemente uma história bem curta, ainda assim, quero poder conferir sim!
Beijo
Oi Alê, tudo bem? Não conhecia o livro e fiquei curiosa sobre o livro quando começou a resenha, mas alguns detalhes me incomodaram e talvez não me atrairiam tanto ao longo da leitura como, por exemplo, o autor dar nome somente aos protagonistas e o excesso descritivo que afasta o leitor. Eu gosto de livros descritivos, mas de forma ponderada, senão se torna maçante. Uma pena a leitura não ter atendido as tuas expectativas, realmente o tema e a premissa são ótimos pontos de partida para essa história, mas se o autor pecou no desenvolvimento é um balde d'água fria.
Beijos, Adri
Espiral de Livros
Interessante o tema e bem atual mesmo. Isso de refugiados e mostrar um pouco da história desses lugares que a gente vê sempre falando em conflitos e coisas assim é interessante. Às vezes a riqueza do lugar , cultura e pessoas se perde nas notícias de conflitos e mais conflitos. Tem tanto pra se explorar e conhecer. Mas a narrativa dele parece pecar em muita coisa heim. Talvez seja um pouco difícil de render a leitura, enrolado de ler. Descrição demais e coisa assim até não me incomoda tanto se o assunto for Interessante, mas é mais demorado. Tem que ter paciência e pode prejudicar muito também. Mas de qualquer forma acho que seria um livro que gostaria de ler . O assunto chama atenção.
Não conhecia esse livro, Alê. Estava interessada com seus primeiros comentários, mas esfriei ao saber que o autor pecou na execução. Ainda acho interessante a premissa, mas fiquei com preguiça. Enfim, ótima resenha.
Beijos!
Poxa, já estava aqui pensando que incluir esse livro na lista.
Se passa em um ambiente que não estou acostumada, e é sempre bom conhecer mais sobre esses países. E o tema abordado é bem interessante e importante.
Eu ficaria incomodada em não saber o nome dos outros personagens, e é uma pena que o autor tenha narrado de uma maneira não tão agradável. Muita descrição acaba sendo cansativo.
A premissa realmente é ótima, mas...
Beijos
Um enredo interessante. É tão chato quando os escritores têm uma boa história, algo que foge do lugar-comum, mas não sabem contá-la bem. Ainda assim, vou colocar na lista. Talvez no futuro tenha interesse em ler.
Não conhecia o livro, mas achei bem interessante.
Adoroooo livros sobre outros países, sobre culturas tão diversas.
Pelo jeito esse é um pouco lento, mal desenvolvido, porém, fiquei curiosa.
bjs
Oi, Alê
Gostei da capa, ainda não conhecia o livro.
Pela premissa do livro você pensa vai ser um livraço, mas uma pena o autor ter direcionado para outro foco. Tinha muito potencial para ser uma das melhores leituras do ano.
Mas mesmo assim penso que a leitura vale a pena para entender as crenças, cultura de outros povos.
Beijos
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