terça-feira, 11 de dezembro de 2018

RESENHA: Passagem para o ocidente

Passagem para o ocidente
Uma das aulas mais intrigantes que tive na pós-graduação de Relações Internacionais foi sobre o Oriente Médio, uma região com uma história riquíssima, marcada por conflitos e que é constantemente mal interpretada. Fascinado pela região, comecei a procurar livros que retratassem essa realidade que é tão desconhecida por mim e foi assim que esbarrei em Passagem para o ocidente, eleito por Barack Obama como “um dos melhores livros do ano”.

Saeed e Nadia são dois jovens que vivem em um país muçulmano e que se conhecem em um curso noturno. Atraídos um pelo outro, acabam dando início a um relacionamento em meio a um ambiente de crescente violência. Quando a guerra civil eclode, eles ouvem rumores sobre portais que levariam para outros países. Desesperados, eles decidem se aventurar por um desses portais, sem imaginar o que os espera do outro lado. 

Saeed e Nadia são o cerne absoluto da estória. Não apenas acompanhamos a evolução de seu relacionamento, mas principalmente seu desenvolvimento como pessoas em cenários extremamente adversos. Chama atenção que o autor, inclusive, não dá nomes a mais nenhum outro personagem, ficando clara sua intenção de focar a atenção do leitor no casal de protagonistas. 

Passagem para o ocidente dialoga com temas relevantes e atuais, como a crise dos refugiados. Por um lado vemos a dificuldade em abandonar sua nação, que é uma parte importante da nossa identidade, bem como de se reintegrar em um novo local, que muitas vezes é avesso a estrangeiros. Outra discussão muito interessante é a questão dos portais que levam para os mais diversos cantos do mundo e como eles, de certa forma, redefinem o conceito de fronteiras. 

“Pode parecer estranho que em cidades cambaleado à beira do abismo jovens ainda compareçam às aulas [...], mas é assim que as coisas são, seja quanto às cidades, seja quanto à vida, pois por um momento estamo entretidos com nossos afazeres habituais e no momento seguinte estamos morrendo, e nosso fim para sempre iminente não interrompe nossos começos e meios transitórios até o instante que o fim chega de fato.” (HAMID, 2018, p. 7-8)

Entretanto, apesar da originalidade e da criatividade da estória, preciso confessar que não gostei da narrativa de Hamid. A meu ver, a regra número um da literatura é o famoso “show, don’t tell”, ou seja, não me diga o que os personagens estão fazendo, me mostre eles fazendo. Infelizmente, Hamid optou por narrar os eventos que acontecem com os protagonistas, bem como seus pensamentos e sentimentos. Essa opção do autor, além de tornar a leitura cansativa, acarretou em um distanciamento do leitor com os personagens, que pareciam estéreis e sem vida

Outro aspecto que não gostei — e que está diretamente conectado com o anterior — é o excesso descritivo. Creio que uma descrição mais sucinta e precisa é suficiente para transmitir uma imagem ao leitor, enquanto que o exagero apenas tende a interromper sua conexão com a estória. Afinal, a quantidade de estímulos visuais parece colocar o desenvolvimento da trama em segundo plano.

Por fim, também achei o desenvolvimento trama um tanto simples e sem gosto, apesar de ter muito potencial. No fim das contas, fiquei com a impressão de que a Hassin tinha mais interesse em fazer o leitor refletir sobre os assuntos que a obra aborda, do que em desenvolver a trama com mais profundidade, o que iria levar a reflexões de forma mais natural. 

Encerrei a leitura com a sensação de que Hassin tinha em mãos uma ótima premissa, mas que pecou na execução. Assim, preciso dizer que achei a declaração de Barack Obama um tanto exagerada. 

Título: Passagem para o ocidente
Autor: Mohsin Hamid
N.º de páginas: 168
Editora: Companhia das Letras
Exemplar cedido pela editora

8 comentários:

Rubro Rosa disse...

Que pena que um enredo tão original não tenha sido bem aproveitado! Falar do Oriente Médio é sempre complicado e complexo,mas dosando isso a personagens bem construídos,com certeza, teríamos algo mais gostoso.
Tá, o romance é bom e tudo mais,mas...não somente isso!!!
Como não conhecia o livro e é aparentemente uma história bem curta, ainda assim, quero poder conferir sim!
Beijo

Espiral de Livros disse...

Oi Alê, tudo bem? Não conhecia o livro e fiquei curiosa sobre o livro quando começou a resenha, mas alguns detalhes me incomodaram e talvez não me atrairiam tanto ao longo da leitura como, por exemplo, o autor dar nome somente aos protagonistas e o excesso descritivo que afasta o leitor. Eu gosto de livros descritivos, mas de forma ponderada, senão se torna maçante. Uma pena a leitura não ter atendido as tuas expectativas, realmente o tema e a premissa são ótimos pontos de partida para essa história, mas se o autor pecou no desenvolvimento é um balde d'água fria.
Beijos, Adri
Espiral de Livros

Cristiane Dornelas disse...

Interessante o tema e bem atual mesmo. Isso de refugiados e mostrar um pouco da história desses lugares que a gente vê sempre falando em conflitos e coisas assim é interessante. Às vezes a riqueza do lugar , cultura e pessoas se perde nas notícias de conflitos e mais conflitos. Tem tanto pra se explorar e conhecer. Mas a narrativa dele parece pecar em muita coisa heim. Talvez seja um pouco difícil de render a leitura, enrolado de ler. Descrição demais e coisa assim até não me incomoda tanto se o assunto for Interessante, mas é mais demorado. Tem que ter paciência e pode prejudicar muito também. Mas de qualquer forma acho que seria um livro que gostaria de ler . O assunto chama atenção.

Gabriela CZ disse...

Não conhecia esse livro, Alê. Estava interessada com seus primeiros comentários, mas esfriei ao saber que o autor pecou na execução. Ainda acho interessante a premissa, mas fiquei com preguiça. Enfim, ótima resenha.

Beijos!

Ludyanne Carvalho disse...

Poxa, já estava aqui pensando que incluir esse livro na lista.

Se passa em um ambiente que não estou acostumada, e é sempre bom conhecer mais sobre esses países. E o tema abordado é bem interessante e importante.
Eu ficaria incomodada em não saber o nome dos outros personagens, e é uma pena que o autor tenha narrado de uma maneira não tão agradável. Muita descrição acaba sendo cansativo.
A premissa realmente é ótima, mas...

Beijos

Unknown disse...

Um enredo interessante. É tão chato quando os escritores têm uma boa história, algo que foge do lugar-comum, mas não sabem contá-la bem. Ainda assim, vou colocar na lista. Talvez no futuro tenha interesse em ler.

Ana I. J. Mercury disse...

Não conhecia o livro, mas achei bem interessante.
Adoroooo livros sobre outros países, sobre culturas tão diversas.
Pelo jeito esse é um pouco lento, mal desenvolvido, porém, fiquei curiosa.
bjs

Luana Martins disse...

Oi, Alê
Gostei da capa, ainda não conhecia o livro.
Pela premissa do livro você pensa vai ser um livraço, mas uma pena o autor ter direcionado para outro foco. Tinha muito potencial para ser uma das melhores leituras do ano.
Mas mesmo assim penso que a leitura vale a pena para entender as crenças, cultura de outros povos.
Beijos

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