“Sem saber o tamanho do lugar, ela imaginou as paredes se fechando sobre ela. Levou a mão à garganta ao sentir como se sufocasse, mas então se obrigou a acalmar-se, respirando fundo para manter o pânico afastado.” (LÄCKBERG, p.52, 2011)
Camila Läckberg: um nome promissor da atual literatura policial. “Gritos do Passado”, segundo livro da autora, não deixa a desejar em nada: trama interessante, explicações satisfatórias, boa narrativa e, ao terminar a leitura, deixa no leitor a certeza de que a autora sabia exatamente o que estava fazendo e onde queria chegar desde a primeira palavra. Mas vamos por partes.
É apenas mais uma manhã na cidade de Fjällbacka, que pouca experiência tem com crimes realmente horrendos, como assassinato, quando o corpo de uma moça é encontrado junto a dois esqueletos. Logo se descobre que esses esqueletos pertenciam a outras duas moças assassinadas com o mesmo modus operandi há 24 anos. Na época, Johannes Hult era o principal suspeito pelos crimes, o que nunca chegou a ser provado, embora o suicídio de Johannes tenha sido considerado uma admissão de culpa. Mas então, quem teria matado a jovem agora? Trata-se de um imitador, ou talvez Johannes tenha sido acusado injustamente? Patrick Hedström é o detetive responsável pelas investigações e se depara com questões complicadas, entre elas o desaparecimento de outra jovem, e com a conflituosa família Hult.
A primeira coisa que me chamou atenção foi ver como Camila despedaça a trama e proporciona momentos de folgas ao leitor, tirando-o da investigação, sem deixa-lo entediado ou se sentindo enrolado. Isso se dá, para citar alguns exemplos, pelos conflitos de personagens como Ernest, o policial relapso; o relacionamento de Patrick e Erica, sua esposa grávida; e até mesmo de Erica e sua irmã, Anna. Com isso Camila também abre diversas pontas e apresenta o ponto de vista de cada um dos personagens (inclusive das vítimas - antes de suas mortes, claro), mesmo mantendo a narrativa sempre em terceira pessoa. Mesmo não sendo frenética, a narrativa flui bem, sem pecar pela falta – ou excesso - de detalhes. A autora usa, ainda, de diversos pequenos artifícios para manter o leitor interessado. São pequenos comentários, sem explicação imediata, que levam o leitor a entender que existe muita coisa por trás de cada personagem e mesmo que elas nada tenham a ver com o mistério central, ainda conseguem deixá-lo com “a pulga atrás da orelha”. Não enlouquecido para descobrir as respostas, mas satisfatoriamente curioso.
A investigação, por sua vez, é lenta, mas não do tipo tediosa. Na verdade, soa bastante real. Enquanto peças vão surgindo e respostas são buscadas, a autora mostra diversas facetas dos personagens - tanto dos policiais, quanto da família Hult - e mantém pequenas histórias paralelas. É lento o suficiente para soar real, sem por isso tornar-se desinteressante.
Gostaria de destacar que todos os personagens criados por Camila me pareceram bastante verossímeis e cada um tem a sua marca e contribuição para a história, sem por isso serem clichês ou estereotipados. Já me deparei com livros em que os personagens pareciam não ter personalidade e serem apenas um nome e uma profissão, ou ainda terem sido desenvolvidos apenas para cumprir uma determinada função da trama e só. Isso não acontece em “Gritos do Passado”. Os personagens atingem aquele patamar em que deixam de ser personagens e tornam-se pessoas, porque a autora nos permite conhecê-los de verdade.
Quanto à surpresa reservada para o final do livro, devo confessar que “Gritos do Passado” apresenta um tipo de desfecho que eu adoro: aquele do qual eu desconfiei durante toda a trama, mas que ainda assim é capaz de surpreender, porque por mais que eu tenha desconfiado, ainda assim cometi alguns erros.
“Gritos do Passado” é um livro bem construído. Camila Läckberg tinha uma boa história nas mãos e soube desenvolve-la e contá-la muito bem. Coloco fé na autora e já tenho outros de seus livros na minha – sempre crescente – lista de desejados.
Título: Gritos do Passado
Autora: Camila Läckberg
Nº de páginas: 362
Editora: Planeta