“Mas não importa que sejam mentiras, porque quando você mora em uma comunidade que acredita nessas mentiras, repete essas mentiras, as mentiras se tornam reais – reais para você, reais para os outros. Você não tem como escapar delas, porque não é uma questão de provas, é maldade, e maldade não precisa de provas.” (SMITH, p. 131, 2015)
Minhas experiências com “Criança 44” e “O Discurso Secreto” foram boas o suficiente para eu ter certeza que leria qualquer livro de Tom Rob Smith, independente da sinopse. “A Fazenda” não foi tudo o que eu esperava do autor, mas foi um bom entretenimento.
Durante toda a sua vida, Daniel testemunhou o relacionamento perfeito de seus pais e quando eles decidiram encerrar o negócio que mantiveram por anos e se mudar para uma fazenda na Suécia, esse devia ser o início de uma nova etapa nas suas vidas. Daniel, porém, quase não manteve contato já que a distância dos pais era uma desculpa para ele continuar a manter sua vida particular em segredo. Ele achava que estava tudo bem, até o dia em que seu pai lhe telefona, dizendo que sua mãe está internada em um hospital e que foi diagnosticada como psicótica. Preocupado, Daniel compra uma passagem para a Suécia, mas antes que embarque, a mãe lhe telefona. Seu pedido é que não acredite em uma palavra do que o pai disse. Ele é um mentiroso e um criminoso. Ela não é louca e não precisa de médicos. O que precisa é da polícia. A partir disso, Daniel fica entre duas versões perturbadoras da mesma história.
Eu lembrava de Tom Rob Smith como um autor de narrativa detalhada e bem escrita, mas o que encontrei em “A Fazenda” foi muito mais fluidez do que as características que minha lembrança guardava. O autor consegue impulsionar o leitor de forma que se torna impossível largar o livro, tanto que eu mal havia começado a leitura e quando vi já estava na página 100.
O livro é construído com trechos curtos, intercalando duas narrativas em primeira pessoa: o relato da mãe de Daniel sobre o que aconteceu no verão, e do próprio Daniel diante de tal relato.
Como já sabemos desde o início que o relato de Tilde – a mãe de Daniel - pode ser um delírio, a personagem se configura como uma narradora não-confiável, já que não importa o quanto ela acredite na história que conta, só temos a palavra dela de que as coisas aconteceram daquela maneira. Mas acreditamos? Embora faça sentido em alguns momentos, em outros o relato parece fruto de alguém que tem mania de perseguição e é isso que mantém o interesse do leitor na história. Para mim, o que aconteceu durante o verão na tal fazenda sueca não era nem de longe tão interessante quanto a consequência desses eventos na dinâmica dessa família. Ao contar uma história em que o marido diz que a esposa está louca e a esposa o acusa de ser um criminoso, estando seu filho no meio das duas versões, Smith cria uma série de perguntas a partir de uma inicial: a história de Tilde é verdadeira ou ela está delirando? Ou seja, quem fala a verdade: ela ou Chris (seu marido)? Se é Tilde, como as lacunas se preenchem e por que o antes sempre dedicado marido se voltou contra ela e se envolveu em um crime? Se é Chris, o que de fato aconteceu que levou Tilde a ter uma interpretação tão errônea e como essa mulher que sempre foi centrada e racional teve um surto psicótico em poucos meses? Por fim, independente de quem fala a verdade, nenhum dos cenários é bom para Daniel já que ou sua mãe está louca ou seu pai é um criminoso. Diante disso, qual será sua reação ao descobrir a verdade? Independente das respostas, a dinâmica dessa família nunca mais será a mesma e, a meu ver, essas consequências são muito mais interessantes do que o mistério da fazenda.
Essa é a razão que me impede de dizer que “A Fazenda” é um ótimo livro. Embora tenha devorado suas páginas, eu não consegui me interessar pela história que Tilde contava. Talvez a intenção do autor tenha sido mesmo fazer com que a história fosse sobre a família e não sobre os eventos do verão, mas para mim ficou faltando um algo a mais.
Além disso, em uma história que se configura desde o início por ser uma coisa ou outra (ou Tilde é louca, ou Chris é criminoso), optar por uma resposta extrema seria simplório e pouco surpreendente, mas Smith consegue criar um desfecho adequado que não faz com que o leitor se sinta enganado. Embora eu não tenha gostado de algumas respostas, considero aceitável o final proposto pelo autor.
Entre erros e certos, acredito que Smith entrega um bom livro de maneira geral. “A Fazenda” não tem o capricho de desenvolvimento de personagens e intrigas de seus primeiros livros, mas mantém o leitor envolvido da primeira à última página.
Título: A Fazenda (exemplar cedido pela editora)
Autor: Tom Rob Smith
Nº de páginas: 333
Editora: Record
Minhas experiências com “Criança 44” e “O Discurso Secreto” foram boas o suficiente para eu ter certeza que leria qualquer livro de Tom Rob Smith, independente da sinopse. “A Fazenda” não foi tudo o que eu esperava do autor, mas foi um bom entretenimento.
Durante toda a sua vida, Daniel testemunhou o relacionamento perfeito de seus pais e quando eles decidiram encerrar o negócio que mantiveram por anos e se mudar para uma fazenda na Suécia, esse devia ser o início de uma nova etapa nas suas vidas. Daniel, porém, quase não manteve contato já que a distância dos pais era uma desculpa para ele continuar a manter sua vida particular em segredo. Ele achava que estava tudo bem, até o dia em que seu pai lhe telefona, dizendo que sua mãe está internada em um hospital e que foi diagnosticada como psicótica. Preocupado, Daniel compra uma passagem para a Suécia, mas antes que embarque, a mãe lhe telefona. Seu pedido é que não acredite em uma palavra do que o pai disse. Ele é um mentiroso e um criminoso. Ela não é louca e não precisa de médicos. O que precisa é da polícia. A partir disso, Daniel fica entre duas versões perturbadoras da mesma história.
Eu lembrava de Tom Rob Smith como um autor de narrativa detalhada e bem escrita, mas o que encontrei em “A Fazenda” foi muito mais fluidez do que as características que minha lembrança guardava. O autor consegue impulsionar o leitor de forma que se torna impossível largar o livro, tanto que eu mal havia começado a leitura e quando vi já estava na página 100.
O livro é construído com trechos curtos, intercalando duas narrativas em primeira pessoa: o relato da mãe de Daniel sobre o que aconteceu no verão, e do próprio Daniel diante de tal relato.
Como já sabemos desde o início que o relato de Tilde – a mãe de Daniel - pode ser um delírio, a personagem se configura como uma narradora não-confiável, já que não importa o quanto ela acredite na história que conta, só temos a palavra dela de que as coisas aconteceram daquela maneira. Mas acreditamos? Embora faça sentido em alguns momentos, em outros o relato parece fruto de alguém que tem mania de perseguição e é isso que mantém o interesse do leitor na história. Para mim, o que aconteceu durante o verão na tal fazenda sueca não era nem de longe tão interessante quanto a consequência desses eventos na dinâmica dessa família. Ao contar uma história em que o marido diz que a esposa está louca e a esposa o acusa de ser um criminoso, estando seu filho no meio das duas versões, Smith cria uma série de perguntas a partir de uma inicial: a história de Tilde é verdadeira ou ela está delirando? Ou seja, quem fala a verdade: ela ou Chris (seu marido)? Se é Tilde, como as lacunas se preenchem e por que o antes sempre dedicado marido se voltou contra ela e se envolveu em um crime? Se é Chris, o que de fato aconteceu que levou Tilde a ter uma interpretação tão errônea e como essa mulher que sempre foi centrada e racional teve um surto psicótico em poucos meses? Por fim, independente de quem fala a verdade, nenhum dos cenários é bom para Daniel já que ou sua mãe está louca ou seu pai é um criminoso. Diante disso, qual será sua reação ao descobrir a verdade? Independente das respostas, a dinâmica dessa família nunca mais será a mesma e, a meu ver, essas consequências são muito mais interessantes do que o mistério da fazenda.
Essa é a razão que me impede de dizer que “A Fazenda” é um ótimo livro. Embora tenha devorado suas páginas, eu não consegui me interessar pela história que Tilde contava. Talvez a intenção do autor tenha sido mesmo fazer com que a história fosse sobre a família e não sobre os eventos do verão, mas para mim ficou faltando um algo a mais.
Além disso, em uma história que se configura desde o início por ser uma coisa ou outra (ou Tilde é louca, ou Chris é criminoso), optar por uma resposta extrema seria simplório e pouco surpreendente, mas Smith consegue criar um desfecho adequado que não faz com que o leitor se sinta enganado. Embora eu não tenha gostado de algumas respostas, considero aceitável o final proposto pelo autor.
Entre erros e certos, acredito que Smith entrega um bom livro de maneira geral. “A Fazenda” não tem o capricho de desenvolvimento de personagens e intrigas de seus primeiros livros, mas mantém o leitor envolvido da primeira à última página.
Título: A Fazenda (exemplar cedido pela editora)
Autor: Tom Rob Smith
Nº de páginas: 333
Editora: Record
17 comentários:
Esse livro é do tipo que eu compraria pela capa, mas ainda bem que li sua resenha, não achei muito a minha cara!
Beijos, Tabatha
http://aproveiteolivro.blogspot.com.br/
OMG! Esse parece um livro misterioso, como você disse acho que se lê-se, não conseguiria largar, hahahaha, adorei a resenha.
Beijos,
cabanadosanjos.blogspot.com
Acho que pelo livro ser por trechos curtos, você devorou mais por isso. Porque também não me interessei taaanto assim pelo o que você contou, mas é sempre bom dar uma chance né? Pra ver no que vai dar. Eu to lendo um agora que eu não esperava nada dele, mas to gostando muito.
Beijos!
www.likeparadise.com.br
Mari!
Realmente era de se esperar mais do livro de verdade, porém acredito que pelo autor, daria uma oportunidade para leitura do livro.
Gosto demais das suas análises sempre corretas e conscienciosas.
cheirinhos
Rudy
A premissa é bem interessante, Mari. E seus comentários sobre o jogo de dúvidas formado pelos relatos divergentes me deixou bastante curiosa. Mas o fato de você ter sentido que faltou alguma coisa me faz ficar com um pé atrás. No entanto, ainda quero muito ler Criança 44. Ótima resenha.
Abraço!
http://constantesevariaveis.blogspot.com.br/
Oi, Mari!
É ótimo quando um livro flui assim de maneira inesperada, mas é uma pena que ele não tenha sido tudo aquilo que você esperava. :/
Achei interessante essa dualidade entre verdades criada pelo autor. :)
Beijo,
Samantha Monteiro
http://www.wordinmybag.com.br/
Oie!
Eu estava curiosa quanto a esse livro, e apesar de tudo ainda estou curiosa para ler XD
Adorei a resenha!
http://meubaudeestrelas.blogspot.com.br/
Menina, essa capa é sinistra, hein? Gostei muito da sua resenha. Ainda não tinha ouvido falar desse autor, e fiquei bem curiosa em relação a essa história. Quero saber quem está falando a verdade.
http://tudoqueeuli.blogspot.com
Já conhecia o autor por outras resenhas, mas ainda não tive oportunidade de ler suas obras.
No meu ponto de vista, A Fazenda é instigante já pela sinopse e pela premissa; eu fiquei aqui lendo a resenha de boca aberta e no final soltei "preciso desse livro". Faz um bom tempo que não leio um mistério daqueles que te deixam em um impasse sobre em quem acreditar. Fiquei muito curiosa!
Oi Mari, que pena que o livro não foi tudo aquilo que você esperava. Primeira vez que ouço falar dele, mas achei interessante a premissa, tem um quê de mistério né? Espero ler um dia e ver o que acho :D
Beijos
http://www.oteoremadaleitura.com
Não conhecia o autor e muito menos o livro, mas você conseguiu me deixar bem curioso para a obra. Aquele trecho no inicio da resenha é bem bacana e fiquei filosofando no significado dele hhahaha
www.booksever.com.br
Não conhecia o autor, mas se mesmo depois de ler que esse livro não foi tudo aquilo fiquei interessada na história, já quero ler os outros dele que você citou e parecem ser melhores rs. Fiquei intrigada com o quote no começo...
http://nerdicesdeumagarota.blogspot.com.br/
Uauu parece ser um ótimo livro para quem gosta de um suspense bem pesado, gostei bastante da premissa, mas no momento ando fugindo desses livros haha! Parabéns pela resenha, objetiva! Conseguiu passar bem os pontos principais da trama e deixando aquele mistério que instiga o leitor ^^
Beijos,
Joi Cardoso
Estante Diagonal
Hey Mari, tudo bem?
É muito triste quando um autor escreve só coisa boa e você fica criando aquela expectativa enorme sobre o próximo livro dele que vai ler só para no final se decepcionar. Foi o que aconteceu comigo na época que estava lendo Percy Jackson e o autor lançou aquele livro lá de mitologia egípcia, que foi tão ruim que nem lembro mais o nome HAHAHAHAHA
Não sou muito fã de livros com capítulos curtos ou grandes demais. Penso que o autor tem que ter uma proporção pois ou ele deixa tudo muito "truncado" ou ele vira um Tolkien da vida que descreve até o musgo das pedras ¬¬. O fato da história narrada não cativar também influencia muito. Se eu não me dou bem com a história logo nas primeiras páginas eu abandono o livro e pulo pra outra leitura. Depois até volto nele, mas com pouca vontade.
Enfim, adorei a forma sincera como expôs sua opinião e acho que vou deixar essa leitura passar, já tenho livros demais para ler antes do fim do primeiro semestre Rsrsrs
Abraços,
Matheus Braga
Vida de Leitor - http://vidadeleitor.blogspot.com.br/
Olá!
Não conhecia esse livro! Gostei da parte em que há mais de uma narrativa sendo explanada, adoro livros assim. Vou anotar na minha lista!
PS: você comentou no meu blog sobre Isabel Allende, dela eu recomendo Eva Luna, um de seus primeiros sucessos, impossível não amar!
resenhaeoutrascoisas.blogspot.com
Oi, Mari!
Ainda não conhecia os romances de Tom Rob Smith, mas fiquei curiosa para ler todos eles - especialmente depois de você ter falado tão bem de “Criança 44” e “O Discurso Secreto”.
Gostei da premissa de "A Fazenda", mas acho que me sentiria incomodada no fim da leitura, assim como você.
Beijocas.
http://artesaliteraria.blogspot.com.br
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