quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

RESENHA: Hitchcock / Truffaut: entrevistas

“O diálogo deve ser um ruído entre outros, um ruído que sai da boca dos personagens cujos atos e olhares contam uma história visual.” (HITCHCOCK apud TRUFFAUT, p.219, 2013)

Não sou uma profunda conhecedora de cinema, mas sou fascinada pelo assunto. Tanto que um dos meus sonhos é estudar teoria e linguagem cinematográfica um dia. Até lá me contento em ler o que posso sobre o assunto. Quando descobri “Hitchcock/ Truffaut: entrevistas” fiquei maravilhada com a premissa: uma série de entrevistas, realizadas na década de 60, nas quais o diretor François Truffaut questiona o mestre do suspense Alfred Hitchcock a respeito de cada um de seus filmes, desde o início de sua carreira em Londres até seus grandes sucessos Hollywoodianos. Sendo uma fã de Hitchcock eu sabia que não poderia deixar de conferir o resultado dessas conversas.

Não costumo intercalar leituras, mas escolhi ler “Hitchcock/ Truffaut: entrevistas” entre um livro e outro para absorver o conteúdo aos poucos. Ao todo foram quase 6 meses de leitura e acredito que esta tenha sido uma escolha acertada.

É preciso esclarecer que esta não é uma biografia sobre Hitchcock, mas sim um estudo de sua obra cinematográfica. O mais extraordinário é ver o olhar do próprio diretor a respeito dos filmes e a sinceridade com que fala sobre coisas das quais se orgulha e outras que gostaria de ter feito diferente, além de ver sua explicação e visão por trás de cenas lendárias (como a da perseguição no deserto em “Intriga Internacional” e do assassinato no chuveiro em “Psicose”) e descobrir a razão que o fez escolher as histórias que contou nas telas.

Também é extraordinário ver a postura de Truffaut que, ao mesmo tempo em que deixa clara sua admiração pelo trabalho do colega diretor, também não se vê de rogado em apontar coisas que considera falhas (coisas com as quais, muitas vezes, o próprio Hitchcock concorda) e esclarecer curiosidades que tem como profissional. Coisas do tipo: “Como essa cena foi feita?”

Nessa entrevista, as perguntas não partem de um único lado e muitas vezes é Hitchcock quem pergunta: “Você gostou da fotografia deste filme?”,“O que você achou dessa cena?”,“Você sabe como conseguimos fazer isso?". Na verdade, o que temos nessas páginas é o registro das conversas entre dois cineastas.

Histórias sobre a vida do próprio Hitchcock se infiltram em meio à conversa, como o seu medo da polícia e a vez em que o FBI mandou que o vigiassem por três meses depois de ele ter feito perguntas a um cientista sobre bombas atômicas (algo que parecia absurdo na época, um ano antes de Hiroshima).

Por fazer uma abordagem completa da obra do diretor, é natural que os primeiros filmes (de sua fase inglesa e mudos) sejam desconhecidos do grande público, mas trilham o caminho até chegarmos aos grandes sucessos hollywoodianos.

Esta é a chamada “Edição Definitiva”, já que a primeira, lançada em 1967, não compreendia os últimos filmes feitos pelo diretor. Em 1983, Truffaut lançou esta versão com base em cartas trocadas com Hitchcock nos anos que se seguiram às entrevistas.

Outro ponto que deve ser mencionado é quantidade de conteúdo que o livro apresenta por meio de imagens. Não há uma única página sem a presença de fotos, seja dos filmes, dos sets de filmagem, do diretor ou da entrevista. O livro só não é perfeito porque não ganhou a capa dura que merecia e pela qual pedia (devido ao tamanho maior que o convencional e ao miolo de qualidade superior que favorece a reprodução de imagens, o livro tornou-se pesado. A capa dura, além de valorizar a edição, sem dúvida a teria deixado mais confortável de manusear).

Considerado uma bíblia pelos cinéfilos, “Hitchcock/Truffaut: entrevistas” inspirou um documentário no qual grandes cineastas da atualidade como Martin Scorsese, Steven Spielberg, David Fincher, entre outros, comentam essa famosa série de entrevistas.

“A obra de Hitchcock fez muitos discípulos, o que é normal quando se trata de um mestre, mas como sempre só se imita o que é imitável: a escolha do material, eventualmente o tratamento dado a esse material, mas não o espírito que o impregnava.” (TRUFFAUT, p.343, 2013)

Alfred Hitchcock inovou em milhares de aspetos e causou fortes emoções no público porque sabia a melhor maneira de contar suas histórias e de manipular a sua audiência. Hoje (em um tempo em que efeitos especiais, 3D e outros avanços tecnológicos são cada vez mais valorizados em detrimento do que realmente importa em um filme, ou seja, a história que ele tem para contar e os personagens que a vivem) muitas delas não funcionariam nas telas de cinema. O lamentável é que muitas pessoas se privam de assistir esses filmes por desprezo ao preto e branco ou por não aceitar uma imagem que não esteja em alta definição. Filmes não tem prazo de validade. E qualquer pessoa que assistir “Psicose” (sem saber o segredo por trás do filme) irá se surpreender com o desfecho. Qualquer pessoa que assistir “Festim Diabólico” ficará angustiada ao acompanhar o desenrolar daquela festa sabendo o que há dentro do baú e as consequências se ele for aberto. Qualquer pessoa que assistir “Janela Indiscreta” sentirá que conhece cada um dos vizinhos do fotógrafo interpretado por James Stewart mesmo que deles nunca se escute uma única palavra. Basta se livrar do preconceito e simplesmente assistir ao filme e logo se perceberá que, na falta desses recursos tecnologicamente avançados, diretores como Alfred Hitchcock eram obrigados a encontrar métodos muito mais criativos e inteligentes para contar suas histórias. A admiração que confessei no primeiro parágrafo dessa resenha ter pela sétima arte vem deles e Hitchcock é um dos meus favoritos, o que tornou essa leitura ainda mais especial.

“Hitchcock/Truffaut: entrevistas” é um livro para o qual, sem dúvida, voltarei. Quando assistir algum dos filmes que ainda não vi, ou rever os meus favoritos, tenho certeza que não resistirei a conferir o que o diretor disse sobre a obra. Um item especial na minha biblioteca.

Por fim, não posso falar sobre um livro cujo tema é a obra de Alfred Hitchcock e não citar os meus filmes favoritos do diretor. Eis meu Top 5: “Um Corpo que Cai”, “Janela Indiscreta”, “Disque M para Matar”, “Festim Diabólico” e “Psicose”.

Título: Hitchcock/Truffaut: entrevistas (exemplar cedido pela editora)
Autor: François Truffaut
N° de páginas: 368
Editora: Companhia das Letras

21 comentários:

Bianca Sampaio disse...

Oi Mari!
Não conheço muito o trabalho de Hitchcock, mas assisti Psicose e reconheço o taleto dele. Achei o livro bastante interessante, principalmente para quem é fã dele.

Beijos,
Epílogos e Finais

RUDYNALVA disse...

Mari!
Nossa! Que livro!
Acrdito que todos que gostam de cinema como nós, devemos ler. Na verdade devemos degustar aos poucos como fez, porque são muitas informações detalhadas que temos de absorver aos poucos esse tem fotos, ainda melhor.
Muito boa indicação.
“Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.” (Cora Coralina)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
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Gabriela CZ disse...

Que livro genial, Mari! Fiquei com muita vontade de conferir, mas certamente só poderei fazer isso depois de ver pelo menos alguns filmes de Hitchcock. Coisa que, apesar de querer muito, ainda não pude fazer. Ótima resenha.

Abraços!
http://constantesevariaveis.blogspot.com.br/

DESBRAVADORES DE LIVROS disse...

Olá, Mari.
Não sou um profundo conhecedor de Hitchcock, mas admiro os trabalhos dele que conheci. Para eu ler essa obra, acredito que teria que ser aos poucos, como você fez, principalmente para eu ir assistindo aos filmes e entendendo melhor sobre o que ele está falando.
Acho interessante o próprio olhar dele sobre os filmes, admitindo, inclusive, o que gostaria de ter feito diferente.
Ótima dica. Anotada.

Desbrava(dores) de livros - Participe do top comentarista de janeiro. Serão dois vencedores!

Mariana Gabriel disse...

Olá!
Achei o livro bem empolgante para interessados. Eu acho muito legal fugir um pouco da rotina literária e ler livros sobre conhecimentos.
Abraços!
apenasumaleitura.blogspot.com.br

Caverna Literária disse...

Com certeza um livro muito interessante! Ele é dono de muitas obras de sucesso, e imagino o quanto tenha a passar de conhecimento nas respostas da entrevistas. Mas acho que é um livro destinado mais aos seus fãs e também para quem gosta de cinema, da produção de um filme, então acredito que não ia cair muito bem pra mim :/

xx Carol
http://caverna-literaria.blogspot.com.br/
Tem resenha nova no blog de "O Lado Feio do Amor", vem conferir!

Carla disse...

Oi, Mari!
Eu AMO os filmes dirigidos pelo Hitchcock! Ele é, sem dúvida, meu diretor preferido do cinema clássico. Eu não conhecia esse livro e já quero pra ontem! Sobre seu top 5: Disque M para matar é o primeiro do meu.

Beijos, Entre Aspas

Inês Gabriela A. disse...

Olá,
Não conhecia o livro, mas obviamente conheço a história do Hitchcock, claro que não com tanta riqueza de detalhe e aquela coisa toda. Ainda não vi seus filmes, mais por eu não ter o costume de ver filmes mesmo do que por qualquer outra coisa.
Beijos.
Memórias de Leitura - memorias-de-leitura.blogspot.com

Sil disse...

Olá, Mari.
Eu não sou muito fã de cinema, raramente vou assistir alguma coisa e não lembro de ter assistido nada dele. Mas acho que deve ser uma ótima obra essa e irei indicar para minha parceira do blog, a Olivia que sei que ela gosta e muito. Eu já fiz isso com um livro, ler ele bem demorado para absorver tudo, mas você bateu meu recorde hehe

Blog Prefácio

Diane disse...

Oi...
Não conhecia o livro, mas, pelo que você resenhou parece ser bem interessante. Já quero ler!
Bjo

http://coisasdediane.blogspot.com.br/

Sora Seishin disse...

Oi Mari!
Eu só conheço os filmes do Hitchcock de ouvir falar, o único que assisti foi Psicose. Acho que precisaria ver os filmes para entender melhor esse livro.

Obs: Tem sorteio novo no blog :)
Beijos,
Sora - Meu Jardim de Livros

Unknown disse...

Oie,
Nossa, que livro. Tenho bastante curiosidade pela vida de Hitchcock, mas tudo que sei foram coisas que li em matérias na internet. Gostei muito da dica, e já quero ler!

Beijos,
Juh
http://umminutoumlivro.blogspot.com/

Unknown disse...

Sinceramente não me interessei muito... Não sou uma grande fã de cinema, mas quem gosta do mestre Hittcock vai adorar com certeza.

Carolina Garcia disse...

Oi, Mari!!

Adorei a premissa desse livro!! :)
Também adoro o cinema e sou muito curiosa para descobrir mais sobre os bastidores.

Incluirei essa obra na minha lista de desejados e espero conseguir lê-la esse ano! Vamos torcer! Hahahaha

Bjs

livrosontemhojeesempre.blogspot.com.br

Unknown disse...

Sinceramente esse livro não me agradou, do tipo que eu colocaria agora na minha lista de desejos, mas acho que leria para agregar conhecimento.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Conheci o trabalho de Hitchcock através da série Bates Motel (baseada no livro Psicose), nunca procurei o livro, mas gosto muito da série e pretendo assistir o filme Psicose. Não sei se pretendo me aventurar nos livros, mas achei bastante interessante esse livro de entrevistas sobre sua filmografia.

Unknown disse...

O livro parecer ser maravilhoso mas no momento minha lista esta gigante e eu amei os trabalhos dele e vi vários filmes dele e quero ler Psicose que já esta na minha lista quem sabe depois que eu ler Psicose eu queira ler esse livro ^^

Daniel Igor disse...

Alfred Hitchcock é um dos maiores gênios do cinema, já assisti um filme sobre o momento da vida dele quando produzia Psicose e fiquei fascinado. Sou louco para ver algum de seus filmes e com certeza um dia o farei! O livro parece mesmo uma obra digna à essa figura. Abraços

Unknown disse...

Oi!
Ainda não assisti nenhum filme do Hitchcock mais já vi varias referencias sobre ele e a famosa cena do assassinato no chuveiro em Psicose e quero muito assistir algum filme dele e adorei essa ideia de um livro com entrevista ainda mais por podemos ver seu ponto de vistas sobre seus trabalhos !!

Ana I. J. Mercury disse...

Da vergonha de dizer, mas eu não sei NADA sobre o Hithcock kkkkkkk
quase não assisto filmes, então não sou entendida dos cinemas kkkkk
porém, gostei muito da sua resenha, deu pra ver que tem paixão pelo assunto, e se eu tiver a oportunidade, lerei a biografia sim.
E também espero muito que você possa estudar tudo sobre cinema que quiser, rs
bjooos

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