“Suas paredes jamais haviam contido uma família. Ninguém nunca havia dado risada lá. A casa era dominada por uma espécie de asfixia, um silencio pesado, que imediatamente lhe dava um ar desconfortável. Nunca mais senti isso em nenhum outro lugar, mas sem dúvida lá havia algo que detectei com uma percepção diferente. Não um fantasma ou algo ridículo do tipo, mas, ainda assim, alguma coisa.” (HURLEY, p. 101, 2016)
Só conheci “Loney” quando recebi a prova do livro de surpresa da Editora Intrínseca. A capa misteriosa, o elogio de Stephen King, os prêmios recebidos e a promessa de sensação de ameaça constante fizeram com que eu me interessasse imediatamente.
Na década de 70, o jovem Smith foi levado, juntamente com seu irmão Hanny e outros membros da comunidade, para passar uns dias na costa da Inglaterra, local de um antigo santuário. Sua mãe, uma religiosa devota, acredita que o lugar poderá curar os problemas de Hanny, mas não sente muita confiança no padre Bernard, o novo pároco da comunidade que tem a difícil tarefa de preencher o lugar deixado pelo amado padre Wilfred, falecido há pouco tempo. Quarenta anos depois, os restos mortais de uma criança são encontrados na região e Smith é obrigado a enfrentar as lembranças do que aconteceu lá.
Há livros em que a atmosfera e o cenário se tornam personagens, tamanho o espaço que ganham na história. Esse é o caso de “Loney”. A narrativa em primeira pessoa feita por Smith é o esforço do personagem de relembrar e contar em detalhes o que aconteceu naquele lugar quando ainda era adolescente e, justamente por isso, está repleta das suas sensações e temores. Isso faz com que o livro seja bastante descritivo (principalmente no começo quando é fundamental estabelecer a atmosfera do lugar), embora não tire em nada a sua fluidez.
O núcleo de personagens é pequeno e são menos ainda os que ganham algum desenvolvimento. A verdade é que alguns eu senti que nem ao menos conhecia, o que é lamentável já que todos pareciam carregam uma bagagem merecedora de aprofundamento. Todos parecem estar angustiados com alguma coisa, todos parecem ter um medo profundo de fazer a coisa errada e serem julgados pelos conhecidos. Explorar isso em meio a um cenário que intensifica esses temores e angústias por ser em si angustiante me parecia bastante promissor, mas não é esse o caminho de Hurley segue. Ainda assim, a abordagem do autor é justificável, afinal,
já que os eventos são narrados por Smith, ganham importância as pessoas que de fato são importantes para ele (sua mãe e seu irmão). Uma pena que mesmo eles não sejam desenvolvidos a fundo, sendo a mãe meramente uma fanática religiosa e Hanny um menino cuja inocência deve ser preservada diante da maldade do mundo.
Meu problema com “Loney” foi que durante toda a leitura eu não encontrei um ponto de interesse e a história toda me pareceu dispersa a ponto de quanto mais páginas eu virava, menos eu sabia para onde estava indo e quais eram as respostas que eu deveria encontrar. Ao finalizar a leitura, me parece que a intenção de Hurley foi justamente deixar que tudo permanecesse misterioso porque essa é a história de um lugar misterioso. As pessoas e os acontecimentos ficam em segundo plano porque é ao lugar que o narrador associa aquelas lembranças, mais do que as pessoas que estavam lá.
Acredito que “Loney” se proponha a envolver o leitor com sua atmosfera e transportá-lo para aquele lugar, mais do que se preocupa em dar respostas e esclarecer detalhes, afinal, se o leitor estivesse lá, seria exatamente isso que ele sentiria. O suspense do livro reside em se estar cercado por algo que não se compreende, mas se sente, e que irá persegui-lo para o resto da vida. Não foi uma abordagem que funcionou para mim, mas eu não diria que foi mal executada, portanto acredito que possa funcionar para leitores que gostam do tipo de suspense que faz sentir mais do que faz pensar.
Autor: Andrew Michael Hurley
N° de páginas: 304
Editora: Intrínseca
15 comentários:
Olá, Mari.
Gosto muito de um bom suspense, mas confesso que eu não sei se leria essa obra. A falta de respostas, a falta de aprofundamento em um número maior de personagens... Todos esses elementos me desanimam bastante. O que mais me chama a atenção é o local em que se passa o enredo ser sombrio.
Ótima resenha, como sempre.
Desbravador de Mundos - Participe do top comentarista de junho. Serão quatro livros e dois vencedores!
Pelo que percebi foi uma leitura confusa pra você. Por mais que esperamos isso do livro, essa coisa de tensão e mistério, queremos também um final, um linha que liga os acontecimentos. Que pena que não funcionou muito bem. Ainda estou lendo resenhas sobre ele, mas não tenho nada firmado.
Abraços
Oi, Mari!
Apesar do elogio do King, eu passo esse livro. Ele já não havia me conquistado de início e, depois da sua resenha, sei que vai ser um desperdício de tempo pra mim.
Beijos
Balaio de Babados
Oi Mari =)
Suspense não chega a ser o meu gênero favorito, porém gostei de suas resenha e é bem provável que eu vá ler esse livro futuramente =)
Beijo*
http://umminutoumlivro.blogspot.com.br/
Oi, Mari!!
Entendo seu sentimento perfeitamente porque também tenho dificuldades com livros que não apresentam um desfecho, sabe? Por mais que alguns façam sucesso e tudo eu não gosto muito. Sinto que fica faltando alguma coisa.
Uma pena que o livro não foi como esperava, mas até que ele parece interessante para o público certo, né?
Bjs!
http://livrosontemhojeesempre.blogspot.com.br/
Estava curiosa por esse livro e seus comentários me deixaram um pouco mais, Mari. Mesmo com os pontos negativos que apontou ainda me parece interessante. Embora não saísse correndo atrás dele. Ótima resenha.
Beijos!
Oie Mari
eu estava com tanta expectativa nesse livro, mas pelo visto é bom não ir com muita sede ao pote rs
Gosto de livros com suspense, mas daqueles que tenham um desfecho.
bjos
www.mybooklit.com
Hey Mari.
Não conhecia o livro, e de cara me chamou muita atenção. Achei a capa bem interessante e bonita, ainda mais aquele pedaço do "y" e da árvore.
Mas ao ler sua resenha percebi que não seria um livro que eu agradaria muito, por mais que eu goste de mistérios prefiro livros que nos dê uma direção e não acabe muito em aberto.
www.booksever.com.br
Me interessei na capa e na premissa, mas pelo que disse, fiquei meio com o pé atrás. Gosto de histórias que me movem, me deixam tensa e ali dentro de tudo sabe, se não for assim nem serve. Adorei a resenha!
http://www.leitorasvorazes.com.br/
Oi, Mari!
Com o elogio do King você não poderia deixar de ler, né? Rsrsrs...
A premissa é muito boa e com certeza vou botar nos meus desejados.
Beijos
http://coisasdediane.blogspot.com.br/
Oie Mari =)
Eu até gosto de narrativas em que o autor vai mais para o lado do suspense. Adoro ficar provando que as minhas teorias estão certas rs..., mas pelo visto esse é aquele livro que vendo uma coisa e entrega outra. Uma pena por que pela premissa a história tinha me deixando curiosa.
Beijos;***
Ane Reis.
mydearlibrary | Livros, divagações e outras histórias...
@mydearlibrary
Achei a capa e edição de capa dura fantástica!
Gostei muito da premissa, embora as resenhas que li falam mesmo que não é tão desenvolvido assim.
To curiosa. Pra quem como eu, não lê muito suspense, provavelmente gostará kkk
bjs
Oi!
Vi esse livro no lançamento, mas ele não tinha me chamando atenção e lendo a resenha vi que não é um livro que irei gostar pois a historia não me convenceu muito e para mim livros muito descritivos não funcionam, mas achei interessante como o autor consegue dar vida ao cenário dentro da historia !!
Agora sim, sua resenha foi esclarecedora, achei que tinha perdido algo, mas era para ser assim mesmo. :)
Acabei ontem de ler o livro. Confesso que ele me deixou profundamente perturbado. Gosto de thrillers diretos, com monstros escondidos no escuro e heróis que no fim vencem e o bem triunfa. Ou seja, livros rasos que não me obriguem a pensar. Não é o caso de Loney. Ele me assustou profundamente exatamente pelo que não mostra, mas está lá o tempo todo. A história é lenta e profundamente desconfortável. O sentimento de ameaça está lá o tempo todo. O grupo religioso está longe de ser um grupo de pessoas puras e sua fé em Deus os faz estranhos naquele lugar que deveria ser sagrado mas do qual Deus está ausente. Quem está lá o tempo todo é o Outro, como se chama no livro. A chave da história está na citação do Evangelho de Mateus, logo na abertura do livro. Se você é uma pessoa religiosa e não gosta de histórias complicadas, passe longe deste livro. De minha parte ele continuará me assombrando por um tempo até eu conseguir digerir tudo que li.
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