segunda-feira, 7 de setembro de 2015

RESENHA: Estação Onze

“Aguentamos porque éramos mais jovens do que vocês quando tudo terminou, pensou Kirsten, mas não éramos jovens o suficiente para não termos absolutamente nenhuma lembrança. Aguentamos porque não temos muito tempo, porque agora todos os telhados estão desabando e, em breve, nenhum dos prédios antigos será um local seguro para entrar. Aguentamos porque estamos sempre em busca do mundo antigo, antes que todos os vestígios desapareçam.” (MANDEL, p. 129, 2015)

Depois de uma epidemia que dizimou 90% da população, o mundo é um grande vazio. Sem energia elétrica, meios de transporte ou estabelecimentos comerciais, a vida se resume à sobreviver um dia após o outro com as coisas mais simples. A contagem do tempo zera e um novo mundo tem início. Ano um, ano dois, ano vinte. É nessa época que a Sinfonia Itinerante viaja apresentando peças de Shakespeare e é através dela que um grupo de personagens sobreviventes irá se cruzar.

A primeira coisa que chama a atenção em “Estação Onze” é o fato de ser uma distopia que não envereda para a aventura ou suspense como a maioria. O que temos é um drama que se vale de um cenário distópico para nos fazer refletir sobre a vida que temos hoje.

E refletir é a palavra-chave aqui. Essa não é uma história sobre uma epidemia ou sobre o que aconteceu antes e depois dela ou como o mundo foi reconstruído. É sobre como os sobreviventes lidaram com o mundo que lhes restou e todos os sentimentos que brotam dessa situação. Acima de tudo, é sobre o vazio que fica e sobre como se escolhe preenche-lo. É sobre o que se lembra do mundo anterior, o que se esqueceu e se sente falta de lembrar, sobre o que foi significativo para ser lembrado e as consequências de tudo isso na maneira como se encara o que a vida se tornou. “Quanto mais a gente lembra, mais a gente perdeu”, diz um personagem em um dado momento. É por isso que um clima melancólico paira sobre todas as páginas.

Com um belo texto narrado em terceira pessoa, a autora intercala pontos de vista e ainda os tempos antes e depois da gripe para nos fazer analisar através das diferentes situações dos personagens um mundo que só passou a ser valorizado depois que não existia mais.

E se a sinfonia é itinerante, a leitura também é, já que pulamos de personagem para personagem. Compreensivelmente, todos parecem compartilhar um sentimento de perda, e encará-lo cada um a seu modo. É nisso que a autora opta por focar, mas sua escolha custou meu envolvimento já que não consegui ve-los como pessoas. Minha impressão é que a autora criou um grupo de personagens para personificar as facetas da situação, mas que suas histórias particulares ficaram em segundo plano. Há de se reconhecer, porém, que da abordagem que escolhe, Mendel estrai o máximo, nos fazendo ver coisas cotidianas como uma geladeira, a chave de casa e as fronteiras entre países, com outros olhos, além de explorar todas as dúvidas e incertezas do ser humano diante da solidão e imensidão do mundo.

A autora acerta em separar os dois pontos temporais em 20 anos. É um tempo curto o suficiente para os sobreviventes adultos lembrarem do que aconteceu, mas longo para as crianças terem esquecido quase tudo. Nisso, uma das personagens mais interessantes é Kirsten, uma atriz da Sinfonia Itinerante, que tinha oito anos quando a epidemia começou, não lembra quase nada, mas sente uma saudade imensa.

Um aspecto interessante é que todos os personagens que acompanhamos se conectam, de uma forma ou de outra, com a morte de Arthur Leander, um famoso ator que infartou no palco ao interpretar Rei Lear, nas vésperas do início da epidemia. Arthur, diga-se de passagem, foi o personagem de quem mais gostei, apenas por ser o único que senti que conhecia mais a fundo.

A presença da arte também merece destaque. Dramaturgia, música e até mesmo HQs exercem seu papel na ligação entre os personagens, mostrando que independente da forma e do tempo, a arte é fundamental para o ser humano.

“Estação Onze” é um belo livro. Bem escrito, com uma premissa interessante e bem aproveitada por um aspecto, mas que deixa a desejar em outro que é crucial: os personagens. Existe uma história macro. De um sentimento para com o fim do mundo como ele era, mas não existem dramas individuais. Ainda assim, é capaz de fazer o leitor refletir em diversos momentos. É uma leitura lenta, que pode ser encantadora ou frustrante, dependendo do tipo de leitor ou do momento que escolher faze-la.

Título: Estação Onze (exemplar cedido pela editora)
Autora: Emily St. John Mandel
N° de páginas: 318
Editora: Intrínseca

25 comentários:

Unknown disse...

Oie,
eu estava me interessando até você dizer 'drama'.
Parece realmente ser um livro bem diferente neh?
Mas não curto dramas, vou deixar a dica passar.

bjos
http://blog.vanessasueroz.com.br

Ana Clara Magalhães disse...

Oi Mari!

Olha, eu não sei como conseguiria sobreviver num mundo desse. Eu sou completamente viciada em tecnologia, não desgrudo do meu celular. Quando fico sem luz, me pego tentando fazer coisas simples como usar o microondas, mesmo sabendo que não tem luz. Acho que esse livro deve realmente ser incrível, mas a narrativa lenta pode me incomodar um pouco. Ainda assim, tenho muito vontade de ler.

Beijo!
http://www.roendolivros.com/

Diane disse...

O livro tem uma premissa bem interessante .
Só de ler a sua resenha já o adicionei nos desejados ... Espero poder ler em breve .
Beijos

http://coisasdediane.blogspot.com.br/

Gabriela CZ disse...

Estava bastante curiosa por esse livro e pela sinopse já tinha imaginado que levaria mais pro drama do que para a aventura. Seus comentários me instigaram ainda mais, Mari. Pois mesmo que o autor tenha pecado com seus personagens, parece ter usado uma abordagem bastante válida. Ótima resenha.

Abraços!
http://constantesevariaveis.blogspot.com.br/

Unknown disse...

Olá, Mari. O livro, Estação Onze, é um - dos muitos - que estou interessado em ler. O que me chama bastante a atenção é a sobrevivência em um mundo onde nenhuma facilidade é oferecida, como as atuais: energia elétrica e meios de transporte são um exemplo. Fiquei curioso demais.

Daniel Igor disse...

Nossa, achei o livro muito interessante! Esse cenário distópico e ao mesmo tempo diferente das outras distopias, com mais cultura e drama, parece ser muito interessante. Louco para ler!
Abraços

Inês Gabriela A. disse...

Olá,
Ando saturada de distopias, mas esse me deixou curiosa. Uma pena que os personagens, parte tão essencial de um livro, não tenham sido bem desenvolvidos.
Beijos.
Memórias de Leitura - memorias-de-leitura.blogspot.com

Unknown disse...

Heey!
Gosto muito de distopias e "Estação Onze" me deixou muito curioso por não se tratar de um livro de aventura, ação e nem nada do tipo. Com certeza vai entrar para a minha lista de desejados ^^
Blog - Desbravando o Infinito

Lih_maria disse...

Oiii =DD
Nossa eu não sabia que era uma distopia...mas adoorei a ideia do livro!
Vou colocar na minha lista de leitura \O/
Adoorei sua resenha!
BJoos
http://chacombolacha.blogspot.com.br/

Mariele Antonello disse...

Eu preciso urgentemente desse livro, sério.
Sua resenha está muito boa, este livro parece ser incrível, achei muito interessante abordar a vida após a epidemia e como os sobreviventes lidam com isso, está em minha lista de leituras e pretendo ler em breve.

Tony Lucas disse...

Oi, Mari! Tudo bem? Adorei a resenha! Confesso que esse não era um livro que eu tinha muita vontade de ler, mas depois de ler sua resenha eu passei a me interessar pelo livro. A premissa dele é muito legal e o modo como a autora construiu a história é fascinante. Espero ler a obra em breve! :)

Abraço

http://tonylucasblog.blogspot.com.br/2015/08/resenha-premiada-johnny-bleas-um-novo.html <- Tá rolando promoção do livro "Johnny Bleas - Um Novo Mundo" lá no blog! ;)

Anônimo disse...

Oi, Mari!

Gostei muito da resenha. Não conhecia o livro, mas o achei tão sutil e peculiar que fiquei com vontade de lê-lo! A premissa é muita boa e diferente, apesar de tratar de um tema bastante abordado.

Beijocas.
http://artesaliteraria.blogspot.com.br

Wislanny Martins disse...

Oi, Mari!
Não conhecia a premissa do livro e gostei demais, também de saber sua opinião. É sempre bom, as vezes, ler livros que nos faça refletir, junto com um bom enredo e escrita, deixa a obra ainda melhor. Adorei!

Beijo.
livrosdawis.blogspot.com.br

Anne disse...

Eu não conhecia, mas parece muito bom! Acho que é daqueles que me prenderiam até a última página!
Beijo

Emerson Andrade disse...

Oi Mari!
Esse livro parece ter uma premissa muito tocante. Um amigo blogueiro leu e amou, e apesar do tamanho dele, fiquei curioso. A central não é minha primeira aposta para leitura, sem dúvidas, mas devido a tantas críticas tão positivas, fiquei com muita curiosidade de saber mais.

Abraços
David Andrade
http://www.olimpicoliterario.com/

Unknown disse...

Oi Mari! Tudo bem?
Não sabia que esse livro é uma distopia e, apesar de adorar esse gênero, acho que não o leria no momento. No entanto, vou anotar a dica pois achei a premissa interessante. Fiquei imaginando como seria viver em um mundo assim.. estou muito dependente da tecnologia rs.
Beijos!

http://versosenotas.blogspot.com.br/

Tô Pensando em Ler disse...

Continuo dividida!! rsrsrs
Adorei a resenha, adorei os pontos positivos, mas os negativos não me tiraram a vontade de ler. Ai ai ai.
Acho que vou ler sim. Porque num modo geral, eu curti!!!

Bjks

Lelê - http://topensandoemler.blogspot.com.br/

Unknown disse...

Olá!
Não conhecia esse livro, mas realmente parece ser bastante interessante. Principalmente por ele ir contra a maré de outras distopias que vão mais para aventura. Gosto de livros que tratam das relações humanas e aparentemente esse livro basicamente fala disso. Entrou facil pra minha lista de leituras

Abraços
http://www.desconstruindooverbo.com.br

Mariele Antonello disse...

Quero muito ler esse livro, achei super interessante a história abordar como seria a vida após o apocalipse, estou super curiosa para começar a ler, sua resenha está muito boa.

RUDYNALVA disse...

Mari!
As distopias tem caído em um lugar comum e se tornado até um tanto repetitivas.
Gosto, não resta dúvida, mas aqui, me parece uma repetição de "Epidemia"...
E em um mundo quase dizimado, as pessoas não terem conexão? É um tanto complicado.
Ainda assim quero fazer a leitura.
“Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos.”(Antoine de Saint-Exupéry)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
Participem do nosso Top Comentarista, serão 3 ganhadores!

Jéssica Soares disse...

Oi, Mari! Tudo bem? Não costumo ler muitos dramas, mas é o cenário de "Estação Onze" que me chama atenção. Mesmo não envolvendo ação e aventura, o clima de pós-apocalipse é ótimo e aliado a esse gênero pode ser muito interessante. Eu gosto da premissa, acho original, mas é uma pena saber que não há um envolvimento bacana com os personagens, isso me tirou um pouquinho do ânimo. Ainda assim, quero conferir logo para saber quais serão minhas impressões! Ah! Devo confessar também que acho essa capa absurdamente linda! Bjs
Jéssica - http://lereincrivel.blogspot.com.br/

Anônimo disse...

Parece ser interessante, mas gosto de um aprofundamento maior nos personagens e pelo visto não é isso que acontece com Estação Onze, não sei se bem o tipo de livro que irei gostar, porém, depois de ler a resenha deu vontade de ler o livro e saber um pouco mais sobre esse mundo.

http://maisumaleitura.blogspot.com.br/

Camila Monteiro disse...

Nossa, eu amei essa resenha. Gostei pra valer e já estou indo colocar a obra na minha estante do skoob. Será legal ler uma distopia diferente de Jogos Vorazes haha

Eloísa Pompermayer disse...

Oláá
Então, eu não ainda não conhecia este livro, mas já me apaixonei assim que vi a capa... Agora após sua resenha posso dizer que eu preciso desse livro para ser feliz rsrsrs
Ameii a resenha e o livro parece ser ótimo e super instigante do jeitinho que eu gosto!
Parabéns.
Bjoos

Jovem Literário

Gustavo Gouveia disse...

Eu estou LOUCO! para ler este livro! Sério! Eu fico roendo as unhas só de pensar nele! Com todas as resenhas que vejo, só me faz ficar mais ansioso ainda para lê-lo. Adoro distopias e adoro arte (e Shakespeare!) e ao misturar esses três elementos, o livro já me conquistou <3

www.cidadedosleitores.blogspot.com

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