quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Conversa de Contracapa # 30

Conversa de Contracapa é coluna off topic do blog Além da Contracapa. Sem limitação temática, iremos explorar todo e qualquer assunto relacionado ao mundo da literatura. 

Há alguns meses li uma matéria da Folha de S. Paulo na qual a presidente do Grupo Editorial Record defendia que seria necessário aumentar o preço dos livros para que as editoras pudessem sobreviver, acrescentando que desde 2004 não se reajusta os livros de acordo com a inflação. A afirmação me surpreendeu pois já acho o preço de capa da maioria das editoras caro. 

É claro que a recessão que vivemos, somada à alta do dólar e ao aumento do valor de insumos, prejudica as editoras. Entretanto, há algo que não foi dito: o próprio Grupo Editorial Record reconhece usar uma estratégia agressiva, publicando inúmeros livros por mês, na expectativa de que os best-sellers compensem os fracassos. E há outras editoras que adotam esta mesma estratégia. No fim das contas, o leitor não paga apenas pela obra que adquiriu, mas também pelos custos daqueles livros que ficaram encalhados no estoque.

Segundo dados da pesquisa “Produção e Venda do Setor Editorial Brasileiro”, em 2015 foram publicados mais de 52.000 livros, entre lançamentos e reimpressões. Se desconsiderarmos os livros didáticos, religiosos, científicos, técnicos e profissionais, chega-se ao número de 18.319, referente às obras gerais. Assim, estima-se que chegaram ao mercado cerca de 1.500 títulos por mês. Tais dados deixam claro a competição acirrada e a publicação desenfreada que está norteando as políticas editoriais. 

O problema é que a quantidade não está sendo acompanhada de qualidade. Já perdi as contas de quantos livros li que apresentavam graves problemas —  os quais, diga-se de passagem, também foram criticados por outros leitores, não se tratando apenas de minha opinião — e que surpreendem por terem sido considerados uma aposta viável. Agora, seja honesto e responda: quantos livros você já leu que lhe deixaram esta mesma sensação? Que lhe fizeram indagar por que uma árvore foi derrubada? 

E me parece que chegamos a este cenário justamente por causa da política editorial que prefere atirar para todos os lados, comprando títulos a granel na esperança de esbarrar em uma mina de ouro. Um exemplo disso são os negócios realizados na Feira de Frankfurt, maior feira editorial do mundo. De acordo com Luiz Schwarcz, presidente da Companhia das Letras, tem se tornado praxe adquirir os direitos para publicação antes mesmo do original estar disponível sendo avaliados por trechos ou, pior ainda, apenas por uma descrição da obra quando se trata de autores que emplacaram seu primeiro best-seller. 

É por isso que tenho uma confiança cada vez maior em editoras com catalogo reduzido e que lançam poucos títulos por mês. Isso por que fica claro que há um trabalho real de avaliação e seleção, que demanda tempo e justifica o número menor de lançamentos mensais. Além disso, a faixa de preço geralmente é mais acessível do que das demais editoras (ainda mais em lojas virtuais), o que pode se justificar pelo fato de não ser necessário compensar os custos dos livros que encalharam. E sem estes custos extras, as edições são extremamente caprichadas, contando, em alguns casos, com material extra e até mesmo com capa dura. 

É claro que editoras são empresas em busca de lucro e necessariamente precisam ajustar seus preços em decorrência das flutuações da economia. Porém, querer repassar o preço de uma política editorial cara e ineficiente para o consumidor me parece uma ideia absurda. O fato é que não há justificativas para tantas publicações de qualidade duvidosa, que apenas enchem estoques e que, provavelmente, serão destruídas depois de alguns anos, a fim de darem lugar às novas apostas. 

Creio que já chegou a hora das editoras verdadeiramente fazerem um trabalho editorial consistente, trazendo para o mercado obras que mereçam ser conhecidas pelo público. Além disso, se não fosse essa avalanche de livros estrangeiros que não passam de apostas, os autores nacionais teriam mais espaço — inclusive nas grandes editoras —, seus livros seriam de fato editados e se tornariam economicamente viáveis. Resumindo: já passou da hora das editoras aposentarem suas bolas de cristal e voltarem a usar a peneira para encontrar obras de qualidade. 


13 comentários:

Luiza Helena Vieira disse...

Oi, Alê!
Realmente tem alguns livros que foram desperdício de papel ao serem lançados. Alguns eu acho que foram "aceitos" pelos leitores por conta de todo o marketing que foi investido.
Beijos
Balaio de Babados
Participe da promoção seis anos de Caverna Literária

Bárbara disse...

Olá!
Que texto maravilhoso!!
Li também essa reportagem e lembro ter achado um absurdo pq concordo com vc qdo disse que os livros aqui no Brasil são bem caros sim, uma média de 30,00 é bem caro.
E infelizmente tudo o que você colocou no texto é verdade, as editoras parece que só visam o lucro, tá...sei que vivemos em um mundo capitalista e é assim que as coisas são. Mas, em minha opinião, se é pra lançar algo, pelo menos que seja algo bom sabe? Que tenha conteúdo, que a revisão seja feita, quantas vezes já não peguei erros de português e de digitação gritantes? É surreal o negócio...

Mas enfim, que tenhamos maiores peneiras né? rs

Parabéns pela reflexão.

Beijos, Bá.
http://cafecomlivrosblog.blogspot.com.br

Gabriela CZ disse...

Dissesse tudo, Alê. Sabemos que manter uma editora custa caro, ainda mais em tempos de crise. Mas numa população que já lê pouco pela dificuldade de acesso aos livros, como se pode aumentar ainda mais os preços? E realmente tem editoras que lançam livros demais por mês, sendo que poucos (às vezes nenhum) soam interessantes de fatos. É doloroso pensar em montanhas de livros sendo destruídos, mas quando árvores são derrubadas em vão é o jeito. Antigamente se dizia que os editores eram exigentes demais, parece que hoje são de menos. Enfim, ótimo post.

Beijos!
Portal Andar de Cima

Ju disse...

Oi Alê, minha opinião é bem similar à sua! A Intrínseca é uma que tem poucos livros por mês, comparada a algumas editoras, e em geral são meus livros favoritos. Além de livros cada vez mais lindos, claro! Não é incomum eu terminar uma leitura com a sensação de que perdi tempo, e gostaria muito mais de que esses livros tivesse sido selecionados de forma mais rigorosa.
Adorei o post.

Beijos

Caverna Literária disse...

Nossa, eu não tava sabendo dessa. Já é um absurdo o preço que pagamos pelos livros! E a Record realmente lança uma tonelada de livros por mês. Seria uma boa pensar em outras estratégias antes de botar o prejuízo nas nossas costas

xx Carol
http://caverna-literaria.blogspot.com.br/

RUDYNALVA disse...

Alê!
concordo plenamente com tudo que disse e acrescento que hoje em dia, com tantos livros disponíveis pela net e em ebooks, os livros físicos diminuem ainda mais as vendas. Mesmo nós que gostamos de 'colecionar' os exemplares físicos, por vezes nos rendemos aos ebooks justamente pelo preço.
“É melhor saber coisas inúteis do que não saber nada.” (Sêneca)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/

Ana Clara Magalhães disse...

Oi Alê!

Olha, nunca tinha parado pra pensar nesse tipo de estratégia, sério. Agora que li o seu texto tudo faz muito sentido na minha cabeça. E realmente, fico até triste em assumir que pelo menos 70% dos livros que ando lendo não são lá essas coisas. É bem triste termos que pagar um absurdo por um livro para compensar os que ficam encalhados viu.

Beijão!
http://www.roendolivros.com.br

Cristiane Dornelas disse...

Nossa, também vi essa noticia e fiquei de boca aberta porque já acho os livros caros! Imagina se aumentam mais os preços? Tenho um treco! Porque se fosse pra comprar um livro tudo bem, mas a gente quer é um monte xD
E não tinha parado pra pensar porque o preço é assim. Que até aqueles livros empacados dão um empurrão pra serem pagos a partir dos outros...nossa =/
Seria bom se fizessem uma avaliação melhor mesmo, se ficassem mais atentos ao que estão publicando. Mas o problema é que o pessoal quer é fazer dinheiro né...

Vanessa Vieira disse...

Gostei do seu texto Alê e concordo em grau e número com você. Não que eu não admire o Grupo Editorial Record, mas além dos preços de seus livros serem abusivos, eles estão publicando obras clichês de gêneros bem saturados do grande público ao invés de tentar reavaliar seu catálogo, afinal temos excelentes autores, tanto nacionais quanto estrangeiros. Abraço!

www.newsnessa.com

Unknown disse...

Adorei o texto! Bom, é fato que cada vez mais livros não tão bons estão sendo publicados. Isso é culpa tanto das editores que estão visando apenas o lucro que vão ter e não se preocupam com a "falta de conteúdo" que estão lançando, quanto dos consumidores. Um exemplo são os livros de youtubers, que estão sempre entre os mais vendidos enquanto vários autores maravilhosos não são reconhecidos.

Enfim, amei o Blog e já estou seguindo.
Beijos <3
Blog Mente Viajante

Sil disse...

Olá, Alê.
Concordo com tudo o que você disse. A coisa já é dificil, temos poucos leitores no Brasil e ainda quer aumentar o preço do que já é caro? Lancem menos livros para ficar encalhado então ué. A Record é uma que faz isso, lançam até dez livros no mês e a gente vê no máximo dois fazendo sucesso. E quem paga por isso? Nós os leitores. Não sabia que lançavam os livro só baseados em trechos e no nome do autor. Quem garante que vai fazer sucesso? E novamente quem paga por isso?

Blog Prefácio

Luciana Campos disse...

Oi, Alê!
Fiquei surpresa pelo tema do post, era um assunto que tem me feito pensar bastante ultimamente, já que tenho tido dó do meu bolso (tenho achado tudo muito caro), e também tenho tido mais controle com o que eu classifico como desejado ou puro fruto de muita divulgação. Realmente acho que falta mais controle e cuidado com o que se é lançado, já chega a ser feio tantas séries/sagas/trilogias que são lançadas no impulso, que não fazem tanto sucesso e as continuações ficam engavetadas pelas editoras.

Ana I. J. Mercury disse...

Aí Alê!!!
Concordo com tudo!!
Realmente as editoras estão apostando em muitas porcarias até, digo isso, porque já li livros ridículos, mal escrito, com preconceitos e abusos velados, entre outras coisas, e só porque o autor é meio famoso ou já faz algum sucesso mesmo, foi contratado.
Esse ano li mais de 150 livros até agora, e só entrou 15 para minha lista de preferidos =(
Li alguns conhecidos, outros nem tanto, e mesmo assim tá difícil, to tentando ler alguns de gêneros diferente pra ver se me empolgo mais.
A maioria dos que gostei foram de autores independentes. Pra você ver como autores sem editoras grandes estão mais bem preparados que os demais.
bjs e parabéns pelo texto incrível.

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