sábado, 26 de maio de 2018

Literatura e a limitação temática imposta pelo governo

Conversa de Contracapa é coluna off topic do blog Além da Contracapa. Sem limitação temática, iremos explorar todo e qualquer assunto relacionado ao mundo da literatura. 

Recentemente, o governo federal lançou um edital para avaliação de obras de literatura para o Programa Nacional do Livro e do Material Didático. Entretanto, uma das especificações do edital é limitação por tema e faixa etária. Ou seja, alunos de determinados anos terão acesso a livros que abordem assuntos pré-definidos. 

Assim, para estudantes do ensino médio serão selecionados livros que abordem temas como projetos de vida, inquietações da juventude, o jovem no mundo de trabalho, cultura digital no cotidiano do jovem, bullying e respeito a diferença, entre outros. O edital esclarece que outros temas poderão ser abordados, desde que “nomeados, definidos e justificados, pela editora, para fins de avaliação”.

Fique claro que não estou criticando a necessidade de que a literatura seja direcionada de acordo com a faixa etária dos estudantes. Livros como Capitães de Areia ou Feliz Ano Velho não são aconselháveis para crianças, afinal, contam com uma temática pesada e com um conteúdo que exige maturidade do leitor. Ou seja, a divisão de livros de acordo com a idade é critério de bom senso

Entretanto, a limitação temática imposta pelo edital já vai muito além de qualquer bom senso, afinal, a literatura não pode ser engessada pelos assuntos que aborda. Creio que a literatura — como qualquer outra expressão artística — serve para nos fazer questionar a nós mesmos e ao mundo a nossa volta, para mostrar diferentes realidades e nos tornar pessoas mais conscientes e empáticas, para nos colocar em contato com nossa humanidade. Se a literatura emociona, entretém, impacta, alerta e inspira, então, por que limitá-la? Por que colocar rótulos? Pior ainda: por que avalia-la pelos assuntos que aborda? 

A limitação temática aponta para outro perigo: a indevida intervenção do Estado nas artes. Se hoje o governo coloca uma limitação temática nas obras direcionadas aos estudantes, me pergunto o que poderá acontecer amanhã. Nem é preciso dizer que arte limitada por um governo, não é arte. É manipulação. 

O edital conta com uma brecha: um dos temas sugeridos para o ensino médio é o genérico “ficção, mistério e fantasia”, que certamente servirá de carta coringa para inúmeras editoras. Ainda assim, preciso admitir que este edital me deixou com um amargo gosto orwelliano na boca.

10 comentários:

RUDYNALVA disse...

Alê!
Acredito que estamos retrocedendo na história quando leio algo do tipo...
Delimitar e esclarecer a faixa etária, até admito, porque realmente tem livros 'impróprios' para determinadas idade, agora em relação ao tema...oras, faça-me o favor...
Agora só falta a censura voltar ao Brasil.
Maravilhoso final de semana!
“O meu objetivo é colocar no papel aquilo que vejo e aquilo que sinto da mais simples e melhor maneira.. “(Ernest Hemingway)
cheirinhos
Rudy

Daiane Araújo disse...

Oi, Alê.

Entendo o seu ponto de vista, e concordo.

Acho que essa intervenção pode ser válida, desde que seja feita com bom senso.

Gabriela CZ disse...

Sou obrigada a concordar contigo, Alê. Uma classificação etária é necessária, mas limitação de temas é lavagem cerebral. É owerlliniano mesmo. Ótimo post.

Beijos!

Maah disse...

OI Alê.
Concordo com você, tem diversos livros que não se encaixam nesses gêneros, mas que tem muito a oferecer para o leitor, a questão da idade é muito óbvio, eu mesma tive que ler livros que até hoje não entendo e tive muita dificuldade em trabalhar na escola quando necessário, acho que é uma ideia interessante, mas que precisa ser estudada com calma, para ver se essa é a melhor opção.
Bjs.

Blog Livros e Ideias da Drica disse...

OI, Alê!

Eu li e reli seu post e, à princípio, não fico muito incomodada com a limitação de faixa etária, nem mesmo em relação aos assuntos abordados. Acho que a classificação etária orienta a faixa de idade que tem maturidade para ler a obra, mas apesar de tudo, a família tem um papel fundamental no incentivo à leitura em todas as idades. Mesmo que essas delimitações sejam implementadas, no final é pai e mãe que decide, em casa o que o filho ou filha tem capacidade de ler na época que está vivendo. Isso parece ser uma espécie de censura, mas que acaba servindo para que a família se envolva nos processos cognitivos ligados à leitura de seus filhos! Não dá pra liberar tudo. Uma pessoa de 10 anos pode até ter maturidade para ler temas polêmicos, depende da relação que tem com sua família, mas outras pessoas podem não ter maturidade suficiente para o mesmo tema, então, alguém tem que direcionar.
Acho que o segredo de tudo é monitorar todas essas limitações temáticas e poder opinar quando tiver condições em favor de melhoria no ato de ler para todos!
Grande abraço,
Drica.

Giovanna Talamini disse...

An-nyong-ha-se-yo!
Concordo com você. Para que limitar determinados temas, sendo que os mesmos devem ser tratados em várias faixas etárias? É complicado...

Nicole Longhi disse...

Um ótimo tema para abordar na coluna! Não sabia do edital, e concordo com a sua opinião também. Colocar classificação etária é uma coisa completamente diferente de limitar o acesso a certo tema que eles julgam é retroceder os anos que conseguimos duramente avançar.
É uma coisa bem complicada levando em conta a situação em que o mundo se encontra atualmente.

beijinhos
She is a Bookaholic

Luana Souza disse...

Nossa não sabia disso e concordo plenamente com você. Classificação etária sim mas querer escolher os temas de leitura é uma manipulação total, parece uma ditadura. Que retrocesso :(

Ana I. J. Mercury disse...

Alê, você disse tudo, concordo com você!
Pra mim, o governo querer interferir em arte, é com certeza manipulação.
Eu acho que os adolescentes de hoje em dia, já tem condições de ler muito conteúdo mais maduro, mesmo que não entenda tudo. Se tem livre acesso a violência e outras coisas piores na tv, por que não ler livros mais densos e complexos?
Espero que os jovens leiam muito e o que quiserem.

Marta Izabel disse...

Oi, Alê!!
Que retrocesso é esse?!! O governo agora que interferir nas obras que são selecionadas para estudantes e vai ter uma intervenção do Estado nas artes?! Nossa que decepção!!

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